EDITORIAL | Brasília, um outro mundo

Imaginava-se, num passado não muito distante, que o vírus que contaminava políticos, produzindo uma espécie de amnésia que os fazia esquecer de suas obrigações, era coisa do litoral, do Rio de Janeiro. Daí, em parte, a ideia da construção da nova capital, que funcionaria também como uma espécie de isolamento, com a mudança dando conta do vírus ao mesmo tempo em que permitiria aos gestores públicos trabalhar livres também de outros tipos de contaminação. Definitivamente os cálculos e previsões falharam, do que nos dá conta os momentos que o País atravessa, carregando ao mesmo tempo uma crise política sem precedentes e a deterioração da gestão pública, com suas consequências, chegando a um ponto extremo.
Nada que pareça preocupar os senhores que, em Brasília, se ocupam presentemente dos arranjos que lhes permitam um bom convívio com o governo que chega, num esquema de negociação que obedece à cartilha de seus interesses e apetites, sem que pareça que lhes diga respeito fatos como o esgotamento das verbas para a merenda escolar, para as farmácias populares e, mais recentemente, para manter de pé, funcionando, as universidades federais.
Esta é a realidade que os moradores de Brasília, aqueles que têm palácios e mansões à disposição ou, mais modestos, pelo menos apartamentos funcionais, que passa distante destes senhores. Afinal, de que outra forma entender que nesse mesmo momento, quando o novo governo negocia a alma para poder continuar pagando o auxílio de emergência aos miseráveis, cogitam de ressuscitar o quinquênio que era paga ao alto escalão do Judiciário, implicando novas despesas que somam bilhões de reais e, sobretudo, provocando um efeito cascata devastador. Por conta das reações que o anúncio provocou, a benesse deve ser adiada. Não é menos vergonhoso, no entanto, que o assunto tenha entrado na pauta das desocupadas excelências de Brasília. E num movimento que, cabe acrescentar, não foi único e nem isolado.
Assim, e como lembrou muito oportunamente a Associação Comercial de Minas em documento recentemente divulgado, enquanto o setor privado, à custa de grandes sacrifícios, se ajustou às novas condições, reduzindo atividade e fazendo cortes inclusive na mão de obra, no setor público nenhuma medida foi levada a cabo, tendo sido preservados empregos, benefícios e salários nos três poderes. Caberia acrescentar, juntando-nos ao protesto e retornando ao início deste comentário, fazem justamente o oposto, como se portadores de um apetite que não conhece limites, confirmando que Brasília continua sendo um mundo à parte.
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