EDITORIAL | Cavando mais fundo

Se acaso ainda faltassem evidências suficientes para comprovar que o Brasil vive a mais grave crise institucional de sua história, certamente não faltam mais. E a certeza de que todos os limites foram ultrapassados toma a forma da aprovação, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, de Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que antecipa de 75 para 70 anos a idade limite para aposentadoria compulsória dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Com o expediente, que vai além de todos os limites da integridade, mais duas vagas, a serem preenchidas no próximo ano, seriam abertas. E sem que fosse respeitado sequer o princípio de que mudanças legais não podem ser retroativas, não se aplicando, portanto, aos atuais ministros.
É pouco provável que a ideia prospere, com os observadores do Planalto afirmando que a proposta deve adormecer na comissão especial a ser instalada na Câmara para avaliar seu mérito, não chegando sequer, cumprindo do ritual dessas ocasiões, a ser submetida ao plenário. Aliás o próprio presidente da Casa, o bolsonarista Arthur Lira, já antecipou que não vê possibilidade de o projeto prosperar, não sendo diferente o clima no Senado. Resta a impressão de que desta vez a base do governo, bolsonarista e seus aliados do Centrão, foram longe demais, tentando repetir a tática de esticar a corda para acabarem dando mais um tiro n’ água.
Seja como for estar feito do estrago, uma vez exibida em extremo o dissenso entre os poderes, o que acaba por fragilizar e manter sob permanente ameaça todo o sistema político, que se enfraquece na mesma medida. E não foi por acaso certamente que a proposta foi batizada, tão logo se tornou conhecida, de “PEC da vingança”, resposta pronta e acabada à ação do Supremo que suspendeu a farra das emendas parlamentares, tão fora de controle que a própria Câmara diz não ter guardados registros relativos à distribuição de pelo menos R$ 20 bilhões. Houvesse seriedade e não estaríamos diante de uma crise político-institucional e sim de mais um caso de polícia.
Ou, como disse o recém-aposentado ministro Marco Aurélio Mello, “quando esse tipo de coisa acontece, a título de retaliação, vemos que não evoluímos como Nação. Na verdade é o contrário. Não é viável nem desejável que esse tipo de discussão ocorra movido pelas vontades e paixões políticas”. Na verdade, diz o também aposentado ministro Carlos Mario Velloso, ”quer se fazer a redução para se efetivar o aparelhamento de órgãos públicos”.
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