EDITORIAL | Como apagar nosso futuro

As mudanças drásticas, e aparentemente para pior, nos mecanismos de financiamento de atividades culturais via incentivos fiscais, têm chamado atenção nos últimos tempos e é objeto de preocupação e acaloradas discussões. Preocupam, igualmente, os cortes de verbas anunciados para as universidades federais, que já padeciam de falta de recursos e tem agora suas atividades ameaçadas.
São políticas públicas que, no mínimo, deveriam estar sendo melhor discutidas, com o objetivo único de aperfeiçoá-las, além de evitar distorções e até supostos desvios de recursos e de finalidades, situação bem ilustrada no financiamento de espetáculos como o Cirque du Soleil, de reconhecida qualidade mas de evidente apelo comercial que evidentemente teria como se sustentar por outros meios.
Outra discussão que também importa e que também deveria merecer mais atenção é a importação de cultura, ou do que se possa entender como cultura, acabando por impor padrões que não são necessariamente os nossos e, pior, tem fragrante unilateralidade e sentido de mera propaganda.
Vale para a televisão, vale para o cinema e vale para a música, territórios hoje predatoriamente ocupados exclusivamente pela indústria norte-americana e sem nenhum espaço para a diversidade. Uma realidade que ficou visível esta semana com um fato inédito, o lançamento de um filme de super-heróis – “Os Vingadores” – que rapidamente se transformou no campeão e audiência e de arrecadação nos principais mercados do mundo e, no Brasil também , está sendo exibido em 800 salas, ou quase 80% das cadeiras disponíveis em todo o País.
Por conta disso, uma produção nacional, com excelente desempenho de crítica e bilheteria, foi simplesmente tirada de cartaz. Uma situação que só foi possível porque hoje tanto a distribuição quanto as salas de exibição são controladas, monopolisticamente, por empresas norte-americanas. O mesmo acontece, e de maneira ainda mais massiva, com a televisão a cabo, que reforça padrões externos e claramente empobrece a cultura, destruindo a diversidade, fundamental à formação e ao próprio conhecimento.
Esta não é uma situação nova, a literal ocupação foi sendo feita aos poucos, e não pode ser debitada ao atual governo. É fundamental, no entanto, perceber o que se passa, encontrar meios de assegurar que os brasileiros tenham acesso à diversidade cultural e de pensamento, assim como proteger a produção nacional, que nem de longe tem condições para enfrentar sozinha os enlatados importados. Ignorar o que se passa, da mesma forma que contingenciar os recursos destinados à educação, será o mesmo que, e sem que vá na afirmação qualquer exagero, apagar o futuro, deixando o Brasil à margem, num retrocesso inconcebível.
Ouça a rádio de Minas