EDITORIAL | Dever comum e não escolha
O anúncio, na semana passada, da aprovação final das primeiras vacinas capazes, em tese, de livrar o planeta das ameaças do coronavírus representou um alívio, mas, já alertaram médicos e cientistas, não permite qualquer relaxamento nas medidas preventivas.
Disso nos dão conta países europeus, mais cuidadosos talvez, que, diante do recrudescimento de contágios e fatalidades, chegam a adotar as mesmas restrições aplicadas no início do ano, não estando descartado um rigor ainda maior. A vacina, produzida em tempo recorde, o que só foi possível porque houve colaboração entre países, instituições científicas e empresas farmacêuticas, é formidável vitória, uma batalha ganha, mas não o fim da guerra.
Em primeiro lugar, a produção na escala e velocidade requeridas encerrara desafios que ainda não foram superados e, levando em conta que será preciso imunizar pelo menos oitenta por cento da população mundial, também uma operação logística em escala nunca vista ou tentada. Dito de outra forma, o início da vacinação ainda este ano, como esperam os britânicos, terá um sentido muito mais simbólico que efetivo, muito longe de significar que a guerra foi vencida ou que tenha chegado o momento de comemorar, baixar a guarda.
Verdade para o planeta, considerados evidentemente em primeiro lugar os países mais adiantados, verdade para o Brasil, para o governo brasileiro mais especificamente, que foge a maior de suas responsabilidades nesse momento com o negacionismo, como se possível fosse ignorar que o número de vítimas fatais já passou de 175 mil.
Da mesma forma, ignorar que estamos bastante atrasados no processo de encomendar e comprar vacinas, enquanto o ministro Eduardo Pazuello, como se tivesse à disposição uma espécie de supermercado de vacinas, diz que escolherá as melhores, segundo ele as “de excelência”. E, para piorar, chega ao cúmulo de afirmar que agora “não há que se falar mais em distanciamento social”, isto no mesmo dia em que no Rio de Janeiro é tido como certo que o sistema de saúde local está muito próximo do colapso e que existem filas, grandes, diante de cada leito de CTI em muitas das cidades brasileiras.
Melhor teria feito o ministro se pudesse anunciar providências concretas para garantir o suprimento de vacinas, por óbvio de qualidade, na quantidade necessária e no tempo mais curto possível. E tudo isso junto com um cuidadoso e bem pensado suporte logístico, campo em que o Brasil tem conhecimento e experiência para levar alguma vantagem, e mais o reconhecimento elementar que a vacinação não é questão de escolha, mas de interesse coletivo e geral.
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