EDITORIAL | Fantasmas bem vivos

Embora sem usar palavras tão cruas, os meios oficiais em Brasília parecem dar por perdida a batalha contra a inflação, que, segundo os dados mais recentes, anualizada já ronda os 9%. É quase o dobro da inflação nos Estados Unidos, embora nas contas do ministro Paulo Guedes estejamos mais ou menos no mesmo patamar. Fatores externos, aliás, ficam entre as explicações prediletas de quem admite o relativo descontrole, mas não a culpa pelo sucedido. Fato é que o velho remédio dos juros já saiu das prateleiras depois de um período de relativa bonança e, pela frente, os indicativos são de que as doses ainda vão aumentar.
Para o Brasil e os brasileiros, esta é uma situação que está bem distante de qualquer novidade, aquele tipo de remédio que costuma, dependendo da dose, se transformar em veneno, que reduz os sintomas mas não cura o doente. Fosse adequada a prescrição e a inflação no Brasil atingido picos de até mil por cento ao ano, como aconteceu no governo Sarney, depois de sucessivos e fracassados “pacotes” salvadores. Fato é que estamos claramente diante do risco de perder a melhor parte das conquistas do Plano Real, que deu ao País, contra a maioria das expectativas, pouco mais de duas décadas de relativa estabilidade monetária.
Desnecessário, talvez até enfadonho, detalhar como e porque chegamos, mais um vez, a correr o risco de retomar os tão temidos “dois dígitos” de inflação anualizada. Melhor apontar que a tese da inflação importada não se sustenta, sendo mais fácil recordar que o governo, notadamente agora, às vésperas de eleições presidenciais e ao contrário de tantas promessas, não fechou a torneira da gastança, deixando de lado a tarefa impositiva de perseguir o reequilíbrio fiscal. Fez e faz exatamente o contrário e, como se não bastasse, manteve a política de equiparação dos preços dos derivados do petróleo às cotações internacionais, dando assim sinal verde para a disparada dos preços dos itens de consumo básico, justamente os maiores dependentes de transporte sobre rodas.
Era preciso ousar, era preciso coragem para fazer diferente, mesmo que desafiando velhos manuais de economia. Não foi o que aconteceu e as consequências aí estão, certamente agravadas pelo contexto de desemprego e aumento do trabalho informal, com forte perda de renda para grande parte da população, sem contar a parcela de empresas que, se não sucumbiram, sobrevivem por teimosia. Enxergar a realidade é o primeiro passo para transformá-la.
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