EDITORIAL | Lição que custou caro

Nos anos 70, do século passado, antes da crise do petróleo, os Estados Unidos enxergavam um futuro em que sua economia, que prosseguiria na condição de líder planetária, teria como pilares o conhecimento e a inteligência. Indústrias como a siderúrgica ou a automotiva, dentre muitos outros exemplos que rotulavam como “sujos”, seriam desmontadas, imigrando para países mais pobres, que ficariam com o serviço pesado, com a ilusão de uma condição melhor, enquanto os Estados Unidos seriam donos do conhecimento, ou do poder real, de mãos dadas evidentemente com o poder financeiro, representado por bancos e bolsas.
Chegaram a trabalhar nessa direção, começando por exemplo com o desmonte de sua indústria siderúrgica, tirando do mapa a até então poderosíssima United States Steel, e abrindo espaço para aço brasileiro, a indústria suja, de pouco valor agregado. A crise do petróleo e os avanços da China ajudaram a desacelerar este projeto, em parte provocando até sua reversão, porém partindo de um ponto em que a economia tradicional já estava enfraquecida.
Mais ou menos nesse ponto ganham força os conceitos de economia global, então largamente propagados. Em tese, um mundo sem fronteiras, sem barreiras, em que a eficiência e, consequentemente, a competitividade determinariam o papel de cada um. Como no Brasil, que fechou sua indústria de autopeças, com os executivos enchendo as bocas para dizer que comprariam aonde fosse mais barato.
Sorte da China, que ganhou espaços e caminha para ser a primeira economia mundial, azar de quem acreditou na fórmula mágica e, com a atual pandemia, logo descobriram que o que diziam ser “modernidade” na realidade promoveu concentração da produção e uma dependência crescente e de altíssimo risco. Quem não se lembra, faz um ano, da corrida mundial para compra de respiradores? Um susto e uma lição que, espera-se, tenha sido bem percebida e, vencida a pandemia, quando chegar o momento da reconstrução, nos tenha ensinado que existem limites para além dos melhores preços, para a concentração de produção, para a dependência que não deve ultrapassar os limites da racionalidade.
A pandemia está abalando o mundo, ceifando vidas numa escala que não tem precedentes, mas também, se quisermos aprender, pode estar nos ensinando os limites do bom senso, sem os quais será impossível construir uma sociedade mais justa, mais equilibrada e de menos riscos.
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