Opinião

EDITORIAL | Lucrando com a dor

EDITORIAL | Lucrando com a dor
Crédito: REUTERS/Arnd Wiegmann

O Fórum Econômico Mundial, que termina amanhã em Davos, na Suíça, e onde o Brasil foi representado pelo ministro Paulo Guedes, da Economia, indica que a distribuição da renda global tornou a economia disfuncional, situação que coloca em risco tudo e todos. A diferença, crescente, entre os que têm tudo e os que não têm nada explica o diagnóstico, sobretudo quando é constatado que mesmo nos dois anos de pandemia a concentração da renda aumentou, assim como as desigualdades. São dados já conhecidos, mas o seu detalhamento, fruto de trabalho da Organização Não Governamental Oxfam, assombra.

A saber: nos últimos dois anos, mesmo com a economia congelada pela pandemia, o planeta ganhou um novo bilionário a cada 30 horas e a maioria fez dinheiro nos setores de medicamentos e alimentos. No corrente ano, a cada 33 horas um milhão de pessoas cruzarão a linha da pobreza enquanto são 2.668 bilionários, ou 573 a mais que em 2020. Muito apropriadamente o estudo apresentado em Davos tem como título “Lucrando com a dor” e nos revela que os mais ricos são donos de US$ 12,7 trilhões, valor 42% maior que o apurado no início da pandemia e equivalente a 13,9% do PIB mundial. Equivale ainda às posses dos humanos que se encontram na faixa dos 40% mais pobres.

Feito o diagnóstico, as prescrições feitas em Davos não escapam ao convencional, àquilo que já foi dito e proposto, sem que o curso dos acontecimentos tenha sido alterado. Falou-se obviamente em redistribuição da renda, como taxação de grandes fortunas e de lucros excedentes obtidos por grandes corporações durante a pandemia. Remédios de febre para um paciente terminal. Faria mais sentido que as ações a serem tomadas, se forem, partam do entendimento e reconhecimento de que a economia global alcançou um nível de disfuncionalidade que implica riscos para todos, numa conta em que quem tem mais fatalmente pagará mais. Ou perderá mais no fim das contas.

Eis o entendimento elementar que não parece ter sido percebido, não pelo menos na intensidade necessária, nos salões de Davos. A sobrevivência dos mais ricos acabará, ironicamente, dependendo da sobrevivência dos mais pobres. Não há como deixar de perceber que é pertinente colocar a questão nestes termos, para assim tentar fazer compreender que nosso planeta requer grandes transformações. Ou, de forma ainda mais direta, dizer a quem precisa ouvir que o equilíbrio será bom para os negócios antes de ser bom para os deserdados.

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