EDITORIAL | Muito além dos limites

A cada dia que passa, a cada novo acontecimento a ser lamentado, fica mais e mais evidente que o Brasil mergulhou, ou foi mergulhado seria mais próprio afirmar, numa senda trágica, rompidos os mais elementares princípios da civilidade. No rol das barbaridades, o mais recente episódio foi o assassinato, em Foz do Iguaçu, no Paraná, de um ativo membro do Partido dos Trabalhadores, tesoureiro do diretório local do partido. O crime, que já completou uma semana, foi amplamente descrito e em detalhes, documentados, diante dos quais não cabem motivos para dúvidas razoáveis ou a motivação do criminoso.
Este chegou ao local em que era comemorado aniversário de 50 anos da vítima em atitude de evidente provocação, já que politicamente colocado em campo oposto. Quaisquer dúvidas que pudessem existir perderiam, como de fato perderam, o sentido com seus brados de “aqui é Bolsonaro”, ao mesmo tempo em que os convidados da festa eram igualmente desqualificados. Houve reação e o ofensor, servidor da Polícia Civil do Paraná, se retirou para voltar logo em seguida armado e atirando. Alvejou o petista, que antes de falecer conseguiu também atirar no agressor que, ferido, está hospitalizado, supostamente em estado grave.
Estes são fatos a lamentar e a condenar, na esperança que excessos não se repitam, tomadas como verdade as alegações das duas partes que desejam e trabalham em prol do melhor para o Brasil e os brasileiros. Igualmente a lamentar incisivamente é a primeira conclusão do inquérito policial a cargo da polícia do Paraná, que classificou o crime como resultado de uma rixa e do acirramento de ânimos, sem elementos comprobatórios de crime político, o que implicaria, no contexto pré-eleitoral, em transferência do inquérito para o âmbito federal.
Os autores dessa tese, alinhavada com surpreendente agilidade, definitivamente não poderiam fazer pior para demonstrar até que ponto chegou o descaso pela verdade e pela opinião pública ou, antes, por pressupostos que deveriam ser inerentes a atividades de agentes públicos. Faltou mesmo – e talvez por enquanto – a conclusão de que o culpado foi a vítima ao tentar, sem sucesso, barrar o direito de expressão do assassino e deixando no ar a impressão de que tudo não passou de um acidente, nunca uma ação deliberada e provocada em que as instituições, a própria democracia, foram igualmente feridas.
Cabe esperar que a questão ainda seja colocada em termos mais apropriados porque, do contrário, o sinal verde pode ser aberto à barbárie.
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