EDITORIAL | Negação da diplomacia

Precisamente ao meio-dia, horário local, do próximo dia 20, quarta-feira, tomará posse o 46º presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. Assim está escrito e deve acontecer, embora os partidários de Donald Trump continuem prometendo manifestações em todo o país, sem contar um novo cerco ao Congresso. Ou seja, pela primeira vez em mais de duzentos anos, desde a fundação do país, existe algum grau de imprevisibilidade na transição e riscos cujas proporções e seriedade podem ser mais bem avaliados a partir do pedido da presidente do Congresso aos comandantes militares para que mantenham longe do atual presidente o fatídico botão capaz de desencadear um ataque nuclear, se acionado.
Desconsideradas as hipóteses mais absurdas, por confiança nos sistemas de segurança do país, há que torcer para que tudo termine bem, que a transição se complete, mesmo que se possa dar como inevitáveis tumultos cuja extensão é difícil antecipar. Uma vez empossado o novo presidente, baixada a poeira, as preocupações mudam de direção e fatalmente chegarão a Brasília, onde o atual governo, ignorando todas as regras da diplomacia, em que o Brasil já foi tido como exemplo, não só apoiou ostensivamente o candidato derrotado como vem hostilizando o vitorioso, numa atitude tão despropositada que pode ser classificada como interferência em assuntos internos de outro país. Também por este lado, nada que tenha sido visto antes.
Não é este jornal, não é apenas a imprensa em geral que enxergam o problema e chamam atenção para os riscos a que o país está sendo exposto desnecessariamente. No Ministério das Relações Exteriores, o Itamaraty de belas e aplaudidas tradições, entidades que representam os diplomatas brasileiros, aposentados inclusive, também chamam atenção para a sequência de equívocos cometidos e condenam as posições do chanceler Ernesto Araújo, que definem como a própria negação da diplomacia. “A situação está chegando a um ponto inimaginável e não há precedentes na história”, resume o respeitado embaixador e ex-chanceler Rubens Ricupero.
Ele também informa que tem conversado com altas fontes da diplomacia norte-americana e da equipe de transição, podendo afirmar que Araújo tem uma péssima reputação nestas esferas. A ponto de poder afirmar que, na sua percepção – e na atenta observação de seus interlocutores – não há como evitar uma ruptura na relação bilateral, caso o chanceler permaneça no seu posto. O tamanho do prejuízo dispensa comentários.
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