EDITORIAL | O déficit esquecido

Gastos excessivos, contas mal explicadas e déficit fiscal em acelerado crescimento estavam entre os argumentos que ajudaram a encurtar o segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. Tirá-la do caminho seria a redenção, dizia-se à época, tudo isso sustentado por um ajuste fiscal que, se necessário, levaria o Executivo Federal a cortar na própria carne.
Não foi preciso muito tempo para que as promessas fossem sendo deixadas de lado, ao mesmo tempo que o então presidente Michel Temer recorria a velhos e conhecidos métodos para, pelo menos, garantir sua cadeira. E ao mesmo tempo alimentar o discurso da oposição, que bradava contra a velha política, prometia disciplina férrea no controle dos gastos e, para não deixar ninguém esquecer, duro combate à corrupção junto com o fim dos conchavos e do clientelismo.
O discurso da nova política convenceu e se transformou na vitória do candidato Jair Bolsonaro, que então anunciava para o primeiro ano de seu governo as reformas administrativa e tributária e ponto final nos antigos processos de convivência entre Executivo e Legislativo.
O novo presidente da República não precisou completar seus primeiros cem dias de mandato, consagrados como espécie de marco das novas gestões, para dar sinais de que seu “posto Ipiranga”, o superministério da Economia, passaria distante da disciplina e da independência prometidas. Afinal, era preciso agradar, compor, mesmo com as torneiras dos gastos abertas pela emergência da pandemia.
Tudo isso ajuda a explicar por que o mercado financeiro anda desconfiado, retraído, revendo suas previsões para o resultado das contas públicas para o exercício corrente e para o próximo. Assim, e conforme contas da semana passada, o déficit primário, que não soma as despesas com juros da dívida pública, ficará perto dos R$ 257 bilhões, ou R$ 7 bilhões a mais que as previsões do mês de abril. Para 2022, ano eleitoral, não custa lembrar, o déficit projetado está em R$ 170 bilhões, ou R$ 8 bilhões a mais que o apontado no mês passado.
Nada que pareça preocupar ou merecer mais atenção, tanto que neste justo momento o governo anuncia concessões ao funcionalismo, deixando para mais tarde o tantas vezes prometido aperto, vespeiro que definitivamente não combina com eleições.
Resumindo, fica tudo como está, restando a conclusão de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, errou feio quando disse, há menos dois anos, que o País estava à beira do abismo, literalmente falido, e não teria como resistir por muito tempo mais.
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