EDITORIAL | O jogo sem imaginação

Em passado não muito distante era comum dizer, sem qualquer pudor, em momentos como o atual, de formação de um novo governo, que determinada pessoa, grupo ou partido político, estava de olho em determinada posição não por conta de seu interesse na área ou conhecimentos, mas, exclusivamente, pelo tamanho do orçamento que viria junto com a cadeira. Era o tempo em que não havia constrangimento em afirmar, dependendo do cacife do interessado, evidentemente, que determinada posição poderia ser aceita, mas desde que “de porteira fechada”. Também nesse particular fica a impressão que pouca coisa mudou, talvez apenas mais discrição, quando nos inteiramos das negociações para a formação do governo a ser empossado no dia 1º de janeiro.
A delicadeza do momento recomenda composições amplas, capazes de curar feridas, ajudar a cimentar a ambicionada pacificação ou, apenas e pragmaticamente, assegurar a governabilidade. São assuntos que obedecem a um roteiro bem conhecido, assim como conhecido é o preço de algumas lealdades, capazes de rapidamente alterar o perfil do Legislativo. Nesse ponto precisamente é que bate mais forte o cacife de cada um, conforme dá a perceber as discussões sobre o destino do Ministério da Infraestrutura, que tem orçamento de R$ 4,7 bilhões e ações de grande visibilidade. Não por outro motivo, apontam as notícias que vêm de Brasília, a pasta estaria sendo tratada no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) como uma espécie de “joia da coroa”, das mais cobiçadas.
Mais do mesmo. Num mundo ideal, tão distante, imagina-se que o Ministério da Saúde, por exemplo, seria entregue a um médico, o tal de “ilibada reputação” e conhecimentos reconhecidos, enquanto a pasta da Infraestrutura estaria reserva a um engenheiro ou a um profissional de formação equivalente, critério fundamental para as escolhas que só então chegariam ao plano da política para os arremates finais. Entre o desejável e o possível parece que permanece aberta uma cratera. E sem ninguém que ambicionando determinada posição procura se credenciar pelos projetos que apresenta, por suas ideias e propostas, sejam pessoais, políticas ou partidárias.
Assim sobrevivem apenas arranjos de conveniência, numa arrumação que, embora sucessivamente repetida, acaba se revelando frágil no sentido político e muito distante dos padrões que, agora ainda mais enfaticamente, a gestão pública no Brasil reclama como algo absolutamente impositivo. Suma ironia, a busca da governabilidade acaba custando a própria governabilidade.
Ouça a rádio de Minas