EDITORIAL | Pecados do progresso

A microeletrônica e, na sequência, a informática e a internet, propiciaram, a partir dos anos 70 do século passado, avanços tecnológicos que pouco tempo antes estavam restritos aos domínios da ficção científica. Foram progressos notáveis, especialmente na medicina, navegação aérea e comunicações, mas que, paralelamente, representaram também dificuldades que podem ser evitadas.
Uma delas diz respeito ao uso prático, cotidiano, que permitem comércio e pagamentos remotos, além de outras supostas facilidades, com serviços de larguíssima escala, em que o contato direto cliente-fornecedor passou a ser cliente-computador. É bem possível que na escala e volume atingido por tais serviços seja impossível, impraticável, o contato direto entre clientes e fornecedores.
Fato é, contudo, que as máquinas poderiam ser ajustadas para um contato mais amigável, enquanto ocorre exatamente o contrário, situação que fica evidente com a distribuição dos serviços de tal forma que adquiri-los é sempre fácil e rápido, enquanto o contato posterior na busca de qualquer tipo de atendimento pós-venda é, segundo revelações recentes, em alguns casos, propositadamente dificultado, com o objetivo assumido de levar o consumidor a desistir de suas pretensões. Para negócios que se apresentam como modernos, voltados e respeitosos com os clientes, é a mais completa vergonha, isto para não usar termo bem mais forte.
Não há nenhuma novidade no que se passa, se não a escala que esta situação ganhou, conforme registram os serviços públicos ou não de reclamações. Algo, portanto, de pleno conhecimento das autoridades reguladoras ou controladoras, que como regra se portam como alguém que não percebe ou não dá importância ao que se passa. Pior ainda no caso brasileiro, onde a privatização dos serviços que dão suporte a estes negócios foi apresentada como capaz de aumentar a concorrência, reduzir preços e melhorar serviços. Rigorosamente cartelizadas, as empresas na realidade fazem o que querem, focadas exclusivamente na venda, muito pouco no atendimento.
Não nos parece necessário reafirmar o óbvio, que todos estes serviços se tornaram essenciais e deles todos dependemos, mas tanto quanto as empresas que operam ou utilizam estas ferramentas e que hoje, não por acaso, se contam entre as maiores e mais ricas do planeta. O que elas não podem e não devem é alimentar a ilusão de que seu poder será eterno, consequentemente, que tudo podem. O mesmo que esquecer que a perenização de qualquer negócio está relacionada menos ao produto e mais ao atendimento e pós-venda. E se não enxergarem, então que os organismos reguladores cuidem de atender a seus deveres.
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