EDITORIAL | Política sem novidades

A temperatura na política nacional continua elevada, conforme sinais claros que puderam ser observados na semana que termina. No cercadinho do Palácio da Alvorada, palco de alguns acontecimentos um tanto bizarros, o presidente da República disse, com alguma dose de surpresa não fossem seus movimentos sempre imprevisíveis, que pode não ser candidato à reeleição no próximo ano, caso os tais “votos impressos e auditáveis”, expressão tirada não se sabe de onde exatamente, não estejam disponíveis.
Um recuo sensível e evidente para quem pouco antes dissera que sem as mudanças reclamadas poderia não haver eleições no próximo ano. Muito provavelmente, nestes já quase três anos de governo, a mais contundente das ameaças de Bolsonaro.
Nada, no entanto, capaz de impedir movimentos na direção contrária, com o presidente também antecipando uma “pequena reforma” ministerial na próxima semana. Algo intrigante, conforme o que já foi antecipado, são as mudanças prometidas para o staff mais próximo do presidente do Palácio do Planalto, em que oficiais generais são substituídos por civis, dando mais força ao tal Centrão e deixando dúvidas sobre uma possível debandada de militares.
O candidato que pode não ser candidato joga, às claras, o jogo eleitoral, buscando reforçar sua posição, mesmo que para isso seja preciso recriar o Ministério da Previdência, que deixa as asas do Ministério da Economia, tornando ainda mais distante a promessa, feita na campanha anterior, que, se eleito, reduziria a quinze os então trinta e poucos ministérios. A conta mais uma vez não fechou, da mesma forma que o ajuste fiscal é, de fato, assunto esquecido.
Em resumo, são os arranjos conhecidos, mais uma vez repetidos, mesmo contrariando tudo que o então candidato disse e prometeu na campanha de 2018. Ao contrário do que dizem aliados, para os quais a rearticulação política em curso visa apenas fortalecer a base política do presidente e, consequentemente, a própria governabilidade, ao mesmo tempo que, em tese, reforça a musculatura para enfrentar as pressões crescentes que vem da comissão parlamentar que apura desvios, das mais variadas naturezas, nas ações de governo destinadas a combater e conter a pandemia. Com alguma dose de inocência, ou coisa muito pior, alguém disse que com a nova estrutura será mais fácil fazer as articulações necessárias.
Concluindo, parece definitivamente claro que a nova política, onde não existiriam espaços para conchavos, morreu antes mesmo de ter nascido e foi devidamente sepultada pelos verdadeiros donos do poder.
Ouça a rádio de Minas