EDITORIAL | Promotores da barbárie

Depois da queda do Muro de Berlim, em 1989, e, na sequência, o colapso da União Soviética com a Guerra Fria, a ameaça de choque entre as duas superpotências chegara ao fim. Para marcar o início de um novo tempo, em que conhecimentos e recursos que a humanidade acumulara ao longo do tempo teriam, finalmente, um destino mais racional, sustentando o fim das desigualdades, o bem comum e, sobretudo, a paz. Uma utopia que não se realizou. Mudou apenas a natureza dos conflitos, que passaram a ser localizados, quase sempre refletindo as mesmas e velhas contendas e nunca tiveram fim, assim como as provocações a eles inerentes.
A recente pandemia, sobre a qual ainda não se pode afirmar que tenha terminado, foi outro momento de aparente inflexão. Houve quem chegasse a imaginar que, afastada a ameaça, contados aos milhões os mortos, a inteligência humana finalmente se voltaria para o bem. Eis que em Washington o novo presidente, talvez simplesmente repetindo a tática de tentar agradar seus rivais internos, dá sinais de inquietação com os progressos da China, que parecem indicar um novo rumo para o planeta, dizendo que faria o possível e o impossível para deter este processo e garantir a supremacia de seu país. Quase simultaneamente a Rússia invade a Ucrânia, é taxada como um povo bárbaro e seu governo como algo comparável ao nazismo. Pode até ser verdade, mas definitivamente não é toda a história porque não conta as provocações da outra parte e o desrespeito aos tratados, que, em tese, conteriam o apetite da Organização do Tratado Norte (Otan), o braço militar dos americanos na Europa Ocidental.
Numa palavra, a Guerra Fria nunca terminou e agora a temperatura volta a subir num nível crítico. É nesse exato momento que, por feliz coincidência, começa em Nova York a reunião dos 191 países signatários do Tratado de Não Proliferação Nuclear, realizada a cada 5 anos mas adiada por dois anos devido à pandemia. Sobre o assunto, disse o secretario-geral da ONU, Antônio Guterres, que “a humanidade está a um erro de cálculo da aniquilação nuclear, risco mais elevado desde o apogeu da Guerra Fria. Tivemos sorte extraordinária até agora, mas a sorte não é uma estratégia ou um escudo para impedir que tensões geopolíticas causem um conflito nuclear”.
Está dado o aviso e ele é tão importante quanto pertinente. O que se passa no Leste europeu ou na Ásia, onde a questão de Formosa voltou ao primeiro plano, obedece ao mesmo roteiro da insanidade que a encorpada desde o final da Segunda Guerra, em 1945. Poder, controle, dominação e ambição são as palavras-chave, enquanto a humanidade não é mais que massa de manobra para os patrocinadores da barbárie.
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