EDITORIAL | Quem ganha e quem perde

A partir de 2016, os preços dos derivados de petróleo dispararam no Brasil por conta da decisão de alinhá-los às cotações do mercado internacional, trazendo de volta uma dependência da qual o País teoricamente se livrara há bom tempo. Mais recentemente, com a guerra no Leste europeu, a escalada foi ainda maior e mais rápida, com a administração federal afirmando que nada poderia fazer a respeito, uma vez que não tinha como influir nas decisões da Petrobras.
Eis que o milagre aconteceu e, a partir do mês de julho, a tendência foi invertida, a ponto de provocar deflação no mês de agosto. Mudanças na política tributária, com desoneração dos combustíveis, explicariam a mágica que, possível, deveria ter sido feita há mais tempo, livrando milhões de brasileiros de utilizarem lenha para cozinhar. Vozes maldosas, talvez não, preferem explicar a reviravolta como consequência da aproximação da eleição.
É preciso entender melhor o que acontece. A Petrobras foi concebida, na segunda metade do século passado, como uma ferramenta estratégica, fundamental para garantir o crescimento e autonomia da economia local. Tudo foi feito para obstar sua criação e adiante seus avanços, primeiro com o argumento de que não existia petróleo nas fronteiras brasileiras, segundo com a alegação de que o “mercado”, no caso as grandes multinacionais do petróleo, poderiam fazer melhor. Faltou dizer, é claro, do ponto de vista de quem, sobretudo depois que a estatal brasileira desenvolveu a tecnologia de prospecção e extração em águas profundas, assim entregando ao Brasil reservas que perfilam ao lado das maiores do planeta, além de autossuficiência em produção de óleo cru.
De qualquer forma uma autonomia relativa, porque enquanto a extração aumentava o refino diminuía, argumento agora utilizado para explicar o alinhamento internacional. Agora falta explicar por que a Petrobras pagou US$ 9,7 bilhões em dividendos no segundo semestre do ano, conforme avaliação de uma consultoria britânica. O valor faz da estatal a empresa que mais pagou dividendos em todo o mundo, numa lista em que é seguida pela Nestlé, Rio Tinto, China Mobile, Mercedes-Benz, BNP Paribas, Ecopetrol, Allianz, Microsoft e Sanofi. O baixo custo da extração, principalmente no pré-sal, explicaria sua posição, independentemente do que possa ter custado aos brasileiros que ainda são acionistas controladores da estatal.
Absolutamente não estranha que notícias a respeito tenham sido dadas tão discretamente, a ponto de passarem quase despercebidas. Triste é constatar ter sido este o resultado de tanta luta, tantos esforços e enormes investimentos ou que tanta gente ainda acredite que é melhor assim, mesmo que as comemorações sejam na Bolsa de Nova York.
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