[EDITORIAL] Receita para sair ganhando
Quem observa a distância, do exterior principalmente, pode ter a impressão de que está em curso no Brasil uma grande liquidação, através da qual políticos ou gestores públicos perseguem a ilusão de que é possível tapar o rombo das contas públicas vendendo estatais sem que nesse processo possam ser percebidos alguns cuidados elementares. Numa escala talvez ainda maior, repetem o que fez, há mais de vinte anos, o então presidente Fernando Henrique Cardoso, com seu programa de desestatização, através do qual prometia liquidar, ou pelo menos reduzir substancialmente, a dívida pública. Não foi o que aconteceu, ao contrário, de lá para cá a situação só piorou. É bem possível que, em Minas, o candidato Romeu Zema, que reduziu a ênfase na abordagem do assunto, tenha se dado conta de que as coisas não são tão simples. Ele mesmo disse, por exemplo, que os recursos de uma hipotética venda da Cemig seriam consumidos em alguns meses e sem produzir os efeitos desejados.
Empresas públicas, por obrigação, deveriam ser paradigmas de eficiência, competência e ética. Como regra, no Brasil, estamos distantes desse ideal, embora seja conveniente lembrar que a própria Cemig já esteve neste patamar. Como já foi dito aqui, não faz o menor sentido repetir, em nome do combate à corrupção e da busca de eficiência, tirar o sofá da sala, para usar a imagem bem conhecida. E tem mais: existem áreas estratégicas e ou de interesse público que devem ser protegidos, que não podem estar sujeitas exclusivamente às leis de mercado. A própria Cemig ilustra o que pretendemos dizer. Ela não foi concebida e construída para gerar lucros que acabam na Bolsa de Nova York. Foi construída para fornecer energia boa e barata para fomentar a indústria mineira e seus maiores lucros seriam indiretos, como foram na fase áurea da economia regional. E também para substituir concessionárias estrangeiras, não mais interessadas no mercado local, que já não atendiam adequadamente.
Vale o exemplo da Cemig e valem muitos outros, inclusive no plano nacional, em que incluiríamos o Banco do Brasil, a Caixa Econômica e a Petrobras, cuja existência tem como fundamento a garantia de suprimento de petróleo, independente de injunções externas e que escapem da especulação sabidamente artificial. O bom senso, o conhecimento da história e uma visão estratégica da economia nacional, exigem esse tipo de abordagem. O que, repetindo para que fique bem compreendido, nada tem a ver com nepotismo, com corrupção ou ineficiência. Nada a ver também com estatais sem função e utilidade, estas sim, cabides de emprego que, o mais rapidamente possível, ou são vendidas ou são extintas. Eis a boa receita.
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