EDITORIAL | Sem memória e imaginação

O ajuste fiscal, não faz muito tempo apontado como tão urgente que, se adiado, levaria o País a um precipício sem fundo, parece ter caído no esquecimento. Em Brasília, nos seus gabinetes mais graúdos, as preocupações são outras, embora digam respeito também à sobrevivência. É nesse contexto, em que política e gestão pública parecem imersos num processo de decomposição que não pode ser comparado a qualquer outro momento da história, em meio a discussões entre um sargento da PM mineira e o segundo nome da hierarquia do Ministério da Saúde discutindo possível compra de 400 milhões de doses de vacina, nada combina e nada tem nexo.
Assim como não combina, pelo conteúdo e pelas circunstâncias do momento, a proposta de reforma tributária apresentada pelo Ministério da Economia. Para resumir e tentar simplificar, a busca do caminho mais fácil, diante de despesas, dívidas e déficit descontrolados, acaba sendo o bolso do contribuinte, mesmo sob o risco, muito provável, de nada ser encontrado por lá. Falta até imaginação quando repete que finalmente os ricos pagarão mais, afirmação que não resiste à mais superficial das análises. Propõe-se exatamente o contrário, tudo isso redundando em maior taxação sobre a atividade empresarial. Hoje a carga tributária sobre empresas é de 34% na média, podendo chegar aos 49% se as propostas do economista Paulo Guedes forem tomadas ao pé da letra.
Um caminho que parte de premissas equivocadas, que deixa totalmente de lado até as promessas de simplificação do sistema tributário, algo que poderia significar menos custos para quem paga e mais recursos para o cofre do Tesouro. Custa nada lembrar que esta foi inicialmente a proposta apresentada, em tese numa linha de continuidade com a administração anterior e aplausos de muitos contribuintes. Estes, pragmáticos ou realistas, sabem muito bem que para cortar impostos o governo teria que começar cortando despesas, o que também não aconteceu, porque também este discurso, que seria uma das marcas fortes da nova forma de administrar, caiu no vazio e foi posto de lado faz tempo.
Sem estimular a produção, consumo e renda, objetivos primários de qualquer programa de recuperação econômica, nada se pode esperar além da diminuição do investimento e da renda, tudo isso na ilusão de que assim é possível preencher o buraco das despesas públicas. Definitivamente não foi o prometido e certamente não é o caminho capaz de alargar os espaços das atividades econômicas, tudo isso traduzido em prosperidade e redução das desigualdades.
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