Opinião

EDITORIAL | Servindo à criminalidade

EDITORIAL | Servindo à criminalidade
Crédito: Freepik

A criminalidade no Brasil, muito provavelmente, assumiu proporções sem paralelo no planeta, pelo menos no sentido de que não existem registros de que em outros países se repita o fenômeno da ocupação territorial, em que o Estado perde todo seu poder e representatividade enquanto facções criminosas assumem o controle de fato.

E não mais apenas nas favelas do Rio de Janeiro, onde esta realidade é parte do cotidiano há décadas. Dessa expansão, que tem como epicentro o sistema carcerário, os sinais mais recentes vêm da Amazônia, conforme tem sido amplamente noticiado. Também vale mencionar, como referência e alerta, a ainda recente intervenção federal no sistema de segurança pública do Rio de Janeiro, que não produziu qualquer efeito ou mudança e da qual não seria impróprio afirmar que acabou sem ter começado.

Tudo, dos pequenos assaltos de rua, em que os alvos são telefones celulares, a roubo de bancos a partir de verdadeiras operações militares, passando por um vasto rol que inclui tiroteios em comunidades, chegando a obrigar o desvio de rotas de helicópteros, passou a fazer parte de uma rotina incorporada ao cotidiano em que escapar, ou não, é uma espécie de loteria. E, para muitos, algo que tem como solução possível cadeias bem trancadas. Mais um engano para quem tentar estudar a questão a partir da perspectiva do sistema carcerário ou das cenas tão comuns em que vítimas reclamam justiça na forma de cadeia para os meliantes.

Informações recentes do Conselho Nacional de Justiça revelam que, em maio passado, a população carcerária brasileira somava 919.651 indivíduos, número bem próximo do dobro das vagas disponíveis. Considerados os presos mantidos em situação irregular, detidos indefinidamente em delegacias, por exemplo, é legítimo deduzir que um número mais real já passou facilmente da casa do milhão. Há uma desproporcionalidade evidente e – conhecidas as condições dos cárceres brasileiros, que também são hoje, como regra, território apartado em que o poder real é das facções criminosas – cabe indagar até que ponto as políticas adotadas, em que autores de pequenos delitos têm o mesmo destino dos mais perigosos criminosos, não representam na realidade um engano fatal.

É bem possível, considerando que nem se fala mais em políticas de recuperação e ressocialização dos apenados enquanto é dado como certo que as prisões brasileiras são na realidade base e escolas do crime, que o esforço equivocado produz, no sentido humanitário e no sentido prático, o pior dos efeitos. Conclusão, aliás, que está levando os países mais adiantados justamente a rever suas políticas de encarceramento.

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