EDITORIAL | Um lugar no futuro

Os acontecimentos na Europa, tendo como epicentro a invasão da Ucrânia pela Rússia e a reação dos países membros da Otan, independentemente de seu desfecho, que tende para algum tipo de acomodação, produzirão efeitos que certamente mudarão a ordem econômica global. As sanções econômicas impostas à Rússia implicam situações novas e muito além das fronteiras daquele país, a começar pela China, que caminha para se tornar a maior economia do planeta e, na mesma velocidade, para ganhar um peso militar que não pode ser ignorado.
Para o país, de certa forma um grande dilema, o de manter a aliança histórica com a Rússia – afinal, os dois países há pouco se proclamaram eternos amigos – mas com a paciência oriental, tendo em conta o seu próprio comércio externo, em que justamente os países alinhados com os Estados Unidos representam 80% dos negócios.
Mudar uma cadeia de suprimentos já consolidada não é tarefa que se possa cumprir da noite para o dia, exatamente como os alemães estão constatando em relação à sua dependência com relação ao gás russo, crucial para a sua matriz energética e em especial para o aquecimento doméstico no seu longo e duro inverno. Dito de outra forma, os efeitos da propaganda, agora exacerbados como nunca antes, não bastam para mudar a realidade ou o fato de que existia um compromisso formal de que a área de influência da Otan não seria expandida. São estes alguns dos ingredientes que alimentam as análises de estudiosos independentes, que também entendem que o ponto final do conflito, quando chegar, poderá ser também o ponto inicial de um processo de desglobalização.
Os líderes mundiais teriam entendido, ou forçados a entender, que países autônomos e que de fato desejam sustentar sua posição, não podem estar amarrados à dependência de fornecedores externos, mesmo aqueles que, numa ilusão de mercado, capazes de oferecer preços mais atraentes. Ou deveriam se lembrar que no auge de seu poderio econômico, nos anos setenta do século passado, os Estados Unidos chegaram a se imaginar capazes de abandonar a indústria pesada, suja e menos lucrativa, para dedicarem-se exclusivamente à produção de inteligência, conhecimento, ilusão que derreteu com a crise do petróleo mas custou caro a setores antes estratégicos, e líderes globais como siderurgia e indústria de material de transporte.
No caso brasileiro, esta mesma lógica, que se confunde com a globalização, custou a quase devastação da indústria de autopeças, eletrodomésticos e brinquedos, cuja produção também foi em busca dos atraentes preços chineses. Concluindo, tentar enxergar como será o futuro pode ser o mesmo que abrir portas mais largas.
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