EDITORIAL | Uma solução inconveniente

As dificuldades que o próximo governo encontrará, na perspectiva das finanças públicas, são muito maiores do que tem sido dito e resultam da não observância de um princípio elementar ensinando que uma caixa d’água nunca permanecerá cheia se o calibre do cano de saída for maior que o de entrada. O princípio se aplica às contas públicas, em que dispêndios nunca poderão ser maiores que ingressos, sob pena de um desequilíbrio estrutural que não é novo, mas foi muito agravado durante o governo que está terminando.
Diante da realidade, tenta-se agora, como em outras ocasiões no passado, fazer mais um arranjo de conveniência, cavando mais fundo o buraco que um dia se transformará num sorvedouro. Ao novo governo, como de resto a qualquer outro, compete fazer contas mais a sério e, a partir delas – e sem espaço para outra conclusão –, simplesmente determinar o que é inadiável, o que é urgente e o que pode ficar para mais tarde, tudo isso entendendo que não existe mágica que sustente, seja na esfera pública, no mundo dos negócios ou no mais simples orçamento doméstico, gastos maiores que receitas. A caixa d’ água esvazia e a sede será inevitável.
No caso presente, esta situação não significa necessariamente que o fim do mundo se aproxima. Não se concordarmos que o setor público no Brasil gasta muito e gasta mal, merecendo ser qualificado também como absolutamente esbanjador. É nesse ponto exatamente que pode ser encontrada a solução, o caminho para atender as emergências e, adiante, consertar o que está errado. Por exemplo, e para tocar no ponto mais sensível, alguém já parou para pensar que o tal auxílio emergencial, proximamente mais uma vez rebatizado, é pago a milhares de pessoas que não se enquadram nas normas do programa e, para piorar, sequer dele tem necessidade? E alguém se lembra, agora, que folha salarial e aposentadorias consomem a fatia mais gorda do orçamento público embora pague-se, para funções equivalentes, em média o dobro do que paga a iniciativa privada, tudo isso sem contar as vantagens indiretas e, ainda pior, as escandalosas “vantagens” ofertadas a quem chegou ao topo da pirâmide?
É daí, claro, que deveria sair o que está faltando, mas não é plausível que o assunto tenha sequer sido cogitado entre os integrantes da equipe de transição, menos ainda entre aqueles que estarão nas posições-chave no próximo governo. Assim, e como tem acontecido, dirá com propriedade que recebeu uma “herança maldita”, mesmo sabendo que entregará outra ainda pior.
Ouça a rádio de Minas