EDITORIAL | Valores a defender

O presidente Bolsonaro não se deu por vencido com a devolução, pelo presidente do Senado, da medida provisória que, trocando em miúdos, poderia melhorar os precários mecanismos de controle da internet e redes sociais. O ataque agora tem como alvo a Câmara dos Deputados, que recebeu praticamente o mesmo texto, só que na forma de projeto de lei.
Enganosamente o argumento, falso, é de que se está defendendo a liberdade de expressão, quando na realidade trata-se exatamente do contrário. Ou alguém equilibrado, independentemente de suas preferências políticas, entenderia como liberdade de expressão os robôs contratados de empresas especializadas e muito bem pagas, cujo trabalho é multiplicar, no volume que o interessado possa e queira pagar, mentiras que lhes sejam de alguma serventia, no campo político ou não.
Os termômetros políticos em Brasília já antecipam que dificilmente o projeto de lei será aprovado, uma vez que não há como deixar de enxergar seus objetivos – e riscos – ou o fato de que a tentativa anterior foi condenada também pelo Judiciário. Para Bolsonaro, cujos apoiadores mínguam a olhos vistos, deixar de contar com este tipo de artilharia pode ser fatal, mas, na realidade, a questão é muito mais ampla e se o presidente da República de fato estivesse preocupado com liberdade de expressão ou com os riscos que sua fala representam, estaria olhando em outra direção. Para apoiar e dar sustentação ao movimento, liderado no Brasil pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) e com representação de entidades de mídia das três Américas.
Em manifesto publicado esta semana, inclusive neste DIÁRIO DO COMÉRCIO, as entidades pedem que se priorize e resguarde o conteúdo jornalístico nas plataformas digitais, o que significa ao mesmo tempo fazer com que estes espaços deixem de ser terra de ninguém e que seja de alguma forma controlado o poder das empresas proprietárias dessas redes, cujo alcance ameaça a liberdade e a pluralidade, além de representar também um monopólio econômico cujo poder e influência é igualmente ameaça global.
Temos dito e repetido que é preciso deter esta escalada, exatamente o contrário do que propõe o projeto de lei mencionado no início desse comentário, cujas intenções são autoexplicativas. Mais amplamente, conforme cobrado pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) e demais signatários do manifesto, é preciso deter as ameaças à propriedade intelectual e a concentração econômica, que pode ser apontada como antônimo da liberdade de imprensa, tanto pior quando exercida numa escala global, capaz de impor valores, cultura e interesses que necessariamente não são aqueles que melhor nos representam.
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