A armadilha está armada

Reduzir drástica e rapidamente a concentração da renda é passo essencial para o reequilíbrio da economia global e sua expansão em bases mais estáveis. Em poucas palavras este foi um dos temas debatidos nesta semana durante o Fórum Econômico Mundial, que será encerrado nesta sexta-feira em Davos, na Suíça. Apesar das resistências, as discussões aparentemente evoluíram, de certa forma reverberando o pensamento do economista Joseph Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel, que tem sido o mais contundente crítico dos desvios da ordem econômica global, demonstrando que a concentração da renda se tornou disfuncional, num processo em que mesmo aqueles que aparentemente ganham acabam sendo na realidade perdedores. Os dados disponíveis e largamente debatidos em Davos dão razão aos críticos.
A conclusão geral é de que uma imensa concentração de poder nas grandes empresas e monopólios em nível global exacerba a desigualdade. Não são ilações, são dados de fácil comprovação, como o fato de que as 148 maiores empresas do mundo lucraram US$ 1,8 trilhão em 2022, com aumento médio de 52% sobre os três anos anteriores enquanto a renda individual decresceu. Se 10% dos dividendos e recompra de ações fossem redistribuídos aos 40% mais pobres a desigualdade global poderia diminuir 21,5%.
Metade do valor estimado seria suficiente para acabar com a pobreza. No Brasil, 27% dos ativos financeiros estão em poder de 0,01% da população; 1% da população detém 63% enquanto os 50% mais pobres ficam com apenas 2%.
Em resumo, discutiu-se em Davos um desequilíbrio estrutural perversamente acentuado, inclusive durante a pandemia e que precisa ser revertido. Na sua medida social, evidentemente, traduzido em melhores condições de vida para parcelas mais largas da população, mas igualmente na perspectiva da economia. A marcha desarrazoada atual, decorrência da ordem econômica estabelecida ao final da Segunda Guerra Mundial, tem igualmente um poder sufocante que, se prosseguir, acabará atingindo também os que hoje se beneficiam da situação. Por outro lado, um capitalismo mais inteligente, consciente, significa mais consumo e novas oportunidades de negócios, além da estabilidade política essencial em todo o processo.
O simples fato de que essas questões já estejam sendo percebidas e discutidas mais abertamente num Fórum da importância do que se realiza em Davos, faz crescer a esperança de que os líderes mundiais estejam percebendo que, ao fim e ao cabo, montaram uma armadilha que de uma forma ou de outra poderá transformá-los em vítimas adiante.
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