Caminho sem volta
Num país tão fortemente marcado por contradições, não poderia ser diferente. Há pouco mais de um ano e diante de informações coletadas pelo Banco Central relativas à escalada dos jogos eletrônicos, o País foi tomado por uma espécie de comoção. Ficamos todos sabendo que apostas estavam consumindo dinheiro retirado da mesa, da alimentação, de milhões de brasileiros. Ficamos sabendo que as parcas economias de aposentados estavam sendo drenadas para a jogatina e até mesmo auxílios do programa Bolsa Família estavam sendo consumidos da mesma forma. Diante do escândalo não faltaram, como de costume, promessas de ações corretivas. De imposição de disciplina capaz de recolocar as coisas nos seus devidos lugares.
Muita conversa, mas a rigor nenhum resultado prático, ficando assim distantes também as lembranças de que a liberação da jogatina eletrônica, piorada pelas plataformas que operam a partir do exterior e assim escapam a qualquer controle, viria em socorro dos combalidos, esvaziados na realidade, cofres públicos. Também não aconteceu e mais recentemente nova tentativa de ampliar a taxação das tais “bets” trombou com os interesses mais sombrios da Câmara dos Deputados. E prevalecendo a alegação oportunista, de cínica conveniência, de que o Executivo não faz mais que cobrar impostos e numa escala sempre crescente. Oposição por oposição, guardando cada vez mais distância de tudo aquilo que realmente deva interessar.
Os relatórios do Banco Central que causaram tanta polêmica e indignação foram esquecidos, não são mais que coisas do passado. A escalada, agora sem mensuração conhecida, certamente prossegue, possivelmente suportada pelo envolvimento do dito crime organizado, dentro e fora do País. Mas tudo parece em ordem, pelo menos para aqueles que acreditavam, e acreditam, que os bons costumes estarão garantidos enquanto cassinos que poderiam movimentar o turismo e mais amplamente a economia permanecem fechados. Algo como um moralismo de porta de igreja que, por mais incrível que pareça, ainda se mantém de pé.
E tudo isso para deixar claro – e como se ainda fosse necessário – como se tornou abissal a distância entre o interesse público, as conveniências básicas do conjunto da população, e aqueles que têm por dever representá-los e defendê-los nas casas legislativas. Para lembrar também que as facilidades criadas e multiplicadas no espaço cibernético definitivamente não podem prosseguir fora de controles mínimos, como se situadas em terra de ninguém, acima do bem e do mal, do próprio regramento sócio-político. Aceitar é o mesmo que concordar que caminhamos para o abismo.
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