Contas públicas: hora de fazer dever de casa

A ilusão de que o reequilíbrio das contas públicas poderia ser alcançado somente com aumento da arrecadação parece ter chegado ao fim. Outra não pode ser a leitura das mais recentes do ministro Fernando Haddad, da Fazenda. Na semana passada, depois de mais um encontro com empresários, ele disse que a agenda de gastos será tratada no que chamou de “ritmo mais intenso”, dando a entender que já trabalha numa “revisão ampla de despesas”. Um esforço que, nas condições que se apresentam, deveria ser parte essencial das políticas públicas e mesmo fora desse contexto só pode ser entendida como a mais elementar obrigação dos agentes públicos. E agora, nas palavras de Haddad, que tiveram repercussão muito positiva, para levar a uma “revisão ampla, geral e irrestrita” das despesas.
E tudo isso, adiantou o ministro, como dever de casa para montagem do orçamento do próximo exercício, trabalho que deve ser iniciado no próximo mês. E deu uma pista crucial: “Gasto primário tem que ser revisto, gasto tributário tem que ser revisto e gasto financeiro, juros, também.” Mesmo que com algum atraso fica a impressão que o caminho correto, no que toca à gestão das finanças públicas, está sendo apontado. Quando fala em juros, por exemplo, o ministro aponta na direção do pagamento do serviço da dívida pública, de longe a maior das contas espetadas no Tesouro Nacional, situação que só piora na medida em que as taxas de juros são mantidas em patamares muito elevados. Por absoluta ironia, se não insanidade, o maior dos devedores é também quem mantém os juros nas alturas.
Para além desse ponto, que deveria ser a questão central em todas as discussões, Haddad apontou também a possibilidade de cortar privilégios, sem que precisasse apontar como e onde. A ninguém escaparia que a folha de pagamentos é justamente a segunda maior despesa para a União. Isso faz lembrar em primeiro lugar que o tal teto salarial é na realidade um enorme faz de conta justamente para abrigar privilégios, ou os tais marajás, que não deveriam existir. Sepultá-los já representaria uma grande faxina na qual estariam incluídos também os apadrinhados, fantasmas que só existem para a folha de pagamentos.
Tudo isso pode ser feito, na realidade já deveria ter sido feito, mas é preciso reconhecer que as ações consequentes dependem menos, ou nada, da caneta do presidente da República e, muito, muitíssimo, dos interesses pessoais ou políticos incrustados na máquina pública e nas três esferas do poder. E é aí precisamente que as boas intenções esbarram num muro inabalável.
O conteúdo continua após o "Você pode gostar".
Ouça a rádio de Minas