Editorial

Falsos pudores

Com a proibição dos cassinos no Brasil, estamos diante de algo que não faz o menor sentido
Falsos pudores
Araxá foi referência em cassino no Brasil, com o pioneirismo do Grande Hotel Termas em 1944 | Foto: Divulgação Daniel Mansur

O ex-governador Israel Pinheiro, o homem a quem Juscelino Kubitschek confiaria, mais tarde, a tarefa de erguer Brasília, gostava de contar como nasceu o projeto do complexo termal do Barreiro, em Araxá. Israel era secretário da Agricultura, a pasta que então abraçava todas as atividades econômicas no governo do interventor Benedito Valadares e nessa condição fez viagem de estudos à Europa. Voltou encantado com complexos termais que visitou na França e na Alemanha e retornou trazendo na bagagem o sonho de fazer o mesmo no Barreiro. Benedito Valadares não aprovou a ideia, que mesmo assim foi levada adiante e delas o interventor só tomou conhecimento quando estavam adiantadas o suficiente para que não houvesse possibilidade de retorno. Israel dava risadas ao lembrar como escapou à ira do poderoso interventor.

Em meados dos anos 40 as obras foram afinal inauguradas, com complexo termal, hospital que nunca chegou a funcionar e ainda hoje permanece fechado, hotel e cassino, este também condenado ao abandono com a proibição do jogo que aconteceu no mesmo momento. Ao longo dos 80 anos agora completados, o Barreiro conheceu altos e baixos, ficou fechado durante anos, foi operado pela estatal Hidrominas e, afinal, entregue em regime de concessão ao setor privado. Hoje faz parte da Rede Tauá, com posição de destaque entre as atrações turísticas de Minas Gerais, mantendo assim vivo o sonho que o saudoso governador Israel Pinheiro foi buscar na Europa.

O Barreiro é joia reconhecida como tal no panorama turístico brasileiro, exibindo características que a arquitetura moderna não foi capaz de replicar, com potencial que certamente ainda não foi devidamente explorado. Poderia ter sido diferente se sua abertura não tivesse coincidido com a proibição do funcionamento de cassinos no País e não há como deixar de perceber – para apontar – a explícita contradição dessa realidade, sobretudo agora com a liberação das operações de cassinos eletrônicos, fora de qualquer controle razoável, que aos poucos vão tomando conta do País, prejudicando inclusive as loterias que guardam relação com investimentos públicos de natureza social e assistencial.

Estamos diante de algo que não faz o menor sentido, que limita a indústria do turismo no País e acaba favorecendo, um tanto perversamente, cassinos que operam no exterior e muito frequentados por brasileiros de maior poder aquisitivo. Gente que certamente preferiria viajar a Araxá, a Quitandinha ou Poços de Caldas, onde existem cassinos que continuam fechados por conta de falsos pudores. Abrir os olhos para a realidade seria por certo a melhor maneira de comemorar os 80 anos do Barreiro.

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