Editorial

No mundo da fantasia

No mundo da fantasia
Todos sabemos que o crédito fácil é uma perigosa tentação | Marcos Santos / USP Imagens

Está valendo desde o início da semana o Desenrola Brasil, nome escolhido para o novo programa de renegociação de dívidas patrocinado pelo governo federal e, numa primeira etapa, destinado a quem tem débitos bancários e renda bruta de até R$ 20 mil. Seriam, segundo estimativas, mais de 70 milhões de brasileiros, ou aproximadamente um terço da população, nessa condição, portadores de CPFs negativados. Definitivamente não é pouca coisa. Socorrer essa gente tem, para o governo, objetivo um tanto pragmático, tratando-se simplesmente de devolvê-los ao rol de consumidores, engordando assim as vendas e sem maiores considerações sobre como e por que tanta gente foi levada a essa condição.

Eis porque o programa agora posto em marcha – e festejado como se fosse mais uma “bondade” em que o “perdão” pode passar dos 80% sobre o total devido – está longe de ser novidade e, tudo indica, em futuro não muito distante será repetido. Em termos um tanto singelos, caberia lembrar que, o que não tem solução, solucionado está, mas seria pelo menos pedagógico saber exatamente por que tanta gente chegou a este ponto. Ou indagar, singelamente, como uma dívida devidamente contratada pode, afinal, ser perdoada em até 80%, ou mais. Tem gente ganhando muito ou tem gente perdendo muito, o que seria de todo conveniente apurar.

Todos sabemos que o crédito fácil é uma perigosa tentação, quando não única tentativa para que milhões de pessoas, brasileiras no caso, possam ter acesso, ainda que mínimo, a bens que, como regra, devem ser incluídos entre suas necessidades básicas. Como é bastante comum afirmar, se a prestação cabe no bolso estará tudo bem, fazendo desaparecer os astronômicos custos desse crédito que adiante se transformará numa conta impagável. Eis o que tem acontecido e para mudar, para fazer melhor ou errar menos, é também fundamental saber o que se passa. Do contrário o perdão sequer terá sentido pedagógico, sendo ao contrário uma espécie de convite a que tudo se repita.

Entra também nessa conta, ou deveria entrar, os juros praticados nessas operações que, escapando de qualquer construção que possa ser defendida tecnicamente, ajudam apenas a consumar o absurdo, alimentando também a inadimplência que acaba sendo um dos pretextos para o comportamento adotado.

Resumindo, tudo errado, tudo feito como não deveria ser feito, numa ciranda que vai se eternizando, que exaure e ajuda a criar uma outra conta que um dia e de qualquer forma acabará tendo que ser paga. Para concluir, nada que pareça fazer sentido.

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