Para onde vai apontar a tesoura dos cortes nas contas públicas?

A teimosa, ou conveniente, tese de que o reequilíbrio fiscal poderia ser alcançado exclusivamente a partir de aumento de receitas foi finalmente posta de lado. Uma dose de realismo tardia que veio acompanhada do reconhecimento de que faltarão – pelo menos – R$ 28 bilhões para que as contas da União ingressem num patamar mais conveniente. E, na sequência, do anúncio de que a equipe do Ministério da Fazenda dirá até o final do mês onde e como serão efetuados os cortes necessários. A rigor, e exceto por detalhes, um cardápio já bem conhecido dos brasileiros e no qual também pode ser percebido não muito mais que um jogo para satisfazer aparências, se não meros arranjos fiscais sem que sejam notadas mudanças de conteúdo.
Poderia e deveria ser bem diferente, pelo menos se entendido que a alça de mira da equipe econômica, com devido aval da esfera política, evidentemente, esteja bem assentada, trocando arranjos por mudanças de mais qualidade. E definitivas se traduzissem comportamento diferenciado, no preciso entendimento da natureza do desarranjo que, quando muito, será mais uma vez contornado. Definitivamente não é o que se pode perceber, a começar do tempo perdido com as alegações de que tudo se arranjaria com aumento de receitas, evitadas assim as dores e inconvenientes políticos dos cortes cirúrgicos.
Enquanto tudo caminha como se não houvesse memória, como se o que foi dito ontem pudesse ser simplesmente esquecido e posto de lado, a tesoura dos cortes aponta na direção de sempre, o que pode significar precarizar ainda mais áreas como educação e saúde ou manutenção da malha rodoviária. Exatamente onde os cortes são menos dolorosos e as pressões políticas mais diluídas. E continuará faltando o exercício do exemplo, com corte das gorduras que se acumulam nas camadas superiores e onde os absurdos soam ou são tratados como naturais, devidos e perfeitamente justificáveis. Ou alguém se lembraria, agora e a sério, das mordomias e dos marajás que não sabem o que seja teto de gastos? Alguém ousaria apontar para quaisquer os absurdos e privilégios, feitos e mantidos com dinheiro público, que permanecerão intocados?
Dirão os técnicos de conveniência, nutridos de oportunismo, que a esquecida faxina geral, mesmo se completada, não bastaria para tapar os buracos nas contas públicas. Pode até ser verdade, mas é certo também que tal procedimento viria acompanhado da força do exemplo e da credibilidade, o bastante para mover montanhas.
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