Editorial

É possível reescrever a história do Haiti?

Nesse mundo de tão rápidas e profundas transformações, perguntas como essa têm cabimento
É possível reescrever a história do Haiti?
Haiti enfrenta severas dificuldades nas mais diversas áreas | Crédito: Pixabay

A Grã-Bretanha foi um dia o império onde o sol nunca se punha, Portugal e Espanha também tiveram seus momentos de glória, ainda que sem tanta pretensão, tudo isso por conta do poder naval e da conquista de territórios na África e Américas. Glórias e poder que foram sendo consumidos à medida em que o colonialismo foi se esvaziando e o poder ganhando outras conotações, abrindo-se, então, espaços para os Estados Unidos, a nova potência global que emergiu dos escombros da Segunda Grande Guerra.

Na perspectiva do Ocidente, ou mais especificamente do eurocentrismo, continuaram se imaginando senhores do mundo, donos do saber e da cultura, sem contar dinheiro e armas. Os donos da verdade foram os mesmos que inventaram o escravismo, abominado só quando esse tipo de exploração, com a Revolução Industrial, deixou de ser-lhes conveniente.

Resumindo, uma hipocrisia sem tamanho e que, na realidade, nunca cessou, permanecendo, com relação ao restante do planeta – Américas do Sul e Central, África e Oriente Médio especialmente – um olhar sempre superior, preconceituoso e racista do qual não faltam pencas de exemplo como se possível fosse esquecer como se deu a colonização, especialmente as barbaridades cometidas na América Espanhola ou na África.

Quem se lembra hoje, a sério, que o Congo foi um negócio particular do rei Leopoldo da Bélgica ? Tudo isso nos ocorre a propósito de recente revelação do respeitado jornal The New York Times, lembrando o Haiti, único país em que os negros de origem africana lideraram o processo de independência e foram os primeiros a fazê-lo, o que só conseguiram depois de acertar o pagamento de indenização à França. O jornal norte-americano revelou agora estudos indicando que essa conta custou aos haitianos algo como US$ 200 bilhões ao longo de 100 anos aproximadamente.

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Sim, ao Haiti, um dos países mais pobres do mundo e que presentemente enfrenta o colapso do governo formal enquanto o poder real é disputado ferozmente por gangues. Simplesmente observando os fatos é de se indagar o que os franceses teriam a dizer ou, num rasgo de otimismo, perguntar-lhes se, acaso, ao se depararem com a realidade, um exame de consciência não os levariam a pensar em de alguma forma reparar os erros que cometeram. Nesse mundo de tão rápidas e profundas transformações, as perguntas têm cabimento.

Quando nada para retirar os europeus um pouco de sua arrogância e de seus preconceitos, como ao imaginarem que do lado de cá do Oceano Atlântico só existam macacos. É preciso, afinal, enxergar de que lado estão os bárbaros, os verdadeiramente selvagens de fato.

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