Editorial

Salvando aparências

Com a proibição dos cassinos, o turismo brasileiro perdeu negócios e investimentos
Salvando aparências
Crédito: Reprodução Adobe Stock

Consta que a esposa do ex-presidente Eurico Gaspar Dutra (1946-1951) teria sido muito religiosa, bem próxima da condição de beata, e por conta de suas convicções convenceu o marido a mandar fechar cassinos existentes no País, proibindo ao mesmo tempo roletas e apostas em geral. Cassinos foram assim proibidos de operar, dentre eles o da Pampulha em Belo Horizonte, da Urca no Rio de Janeiro e Quitandinha em Petrópolis. Sem contar o Barreiro, em Araxá, que acabara de ser construído, e outros em estâncias hidrominerais. A proibição formal prossegue, o que absolutamente não quer dizer que a jogatina tenha sido efetivamente paralisada. Longe disso, como bem poderiam lembrar os praticantes do jogo do bicho, de ampla difusão nacional, ou os que preferem máquinas caça-níqueis e, mais recentemente, adeptos das apostas eletrônicas.

Tudo, talvez, apenas para fazer lembrar Dona Santinha, como era conhecida a esposa do presidente Dutra, e em alguma medida salvar as aparências ou, talvez, quem sabe, apenas repetir o expediente de criar dificuldades para vender facilidades. A quem acredite que na verdade os cassinos foram fechados e assim permanecem apenas para não prejudicar o negócio dos bicheiros, cuja influência no passado foi muitíssimo maior que no presente. Certo é que durante todo esse tempo, hoje já bem mais que meio século, o turismo no País perdeu negócios e investimentos, além da receita gerada por jogadores mais abonados que simplesmente passaram a fazer suas apostas nas roletas de Las Vegas ou onde mais estivessem ao alcance.

Sobraria, assim, a conclusão de que manter as aparências pode ser mau negócio, o que por sinal continua acontecendo. Basta saber, como há pouco foi revelado, que mais da metade, precisamente 51% das apostas esportivas realizadas por meios eletrônicos no Brasil, ainda acontecem em plataformas clandestinas, a maioria delas operadas de fora do País, o que implica perda anual, direta, da ordem de R$ 10 bilhões. E sem que nessa conta entrem prejuízos indiretos, representados por velhinhos aposentados ou até mesmo beneficiários do programa Bolsa Família, que, comprovadamente como revelou o Banco Central, reduzem despesas com alimentação para que possam continuar apostando.

Uma descoberta que deu muito o que falar, faz alguns meses não deu em nada no que toca à supressão dos desvios. Um assunto que parece esquecido, posto de lado como se não tivesse importância, como a própria lembrança da esposa que levou um presidente da República a mandar fechar cassinos. Apenas para salvar as aparências.

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