Um momento de grandeza

Convidado pelo presidente François Macron para reunião de cúpula em Paris, semana passada, o presidente Lula fez um discurso absolutamente impactante, colocando a questão das relações internacionais, das desigualdades em particular, num patamar tão corajoso e verdadeiro quanto absolutamente inédito. O presidente brasileiro, que no País continua sendo visto pelas lentes desfocadas das paixões, recuou ao final da Segunda Grande Guerra para assinalar que os países ricos foram capazes de promover a reconstrução da Europa e abrir caminho para a integração do Continente, mas não se deram conta, ou não tiveram interesse, em vencer os desequilíbrios predominantes nos países periféricos, especificamente na África e América Latina. Bem ao contrário, ajudaram a cavar mais fundo o fosso que separa os muito ricos dos que nada têm.
Lula, ouvido em silêncio absoluto e aparente atenção, até pelo ineditismo de suas palavras, mostrou como e porque a ordem econômica estabelecida em 1945 caducou, da mesma forma que a relação de forças então definidas e bem simbolizadas na criação da Organização das Nações Unidas (ONU), que foi capaz de criar o Estado de Israel mas ainda não encontrou destino melhor para a população palestina, lembrou. Mostrou, sobretudo, como o desequilíbrio estrutural foi aos poucos se transformando, também, no elo frágil do próprio poder dominante, devendo ser visto não como vantagem mas como ameaça. Independentemente das injustiças que ajuda a consolidar e a ampliar.
Sem arroubos, sem mudar de tom, com a serenidade de quem sabe estar do lado certo, com simplicidade e clareza o presidente brasileiro viveu naquele momento o que será, provavelmente, o seu ponto mais elevado. Independentemente da possibilidade de que sua fala, pela própria importância e contundência, seja apagada ou revertida de uma coloração política que absolutamente não lhe cabe. Bem ao contrário, e justamente por expor feridas demasiadamente inconvenientes ou propor alternativas que não cabem em raciocínios limitados e interesseiros, é bem possível que Lula sofra pressões ainda maiores, quem sabe no limite do extremo.
Certo é que nunca na história, para repetir expressão que o próprio utiliza com frequência, a nova ordem estabelecida ao final da Segunda Guerra e na sequência apresentada falsamente como a divisão entre o bem e o mal, foi contestada de forma tão contundente, calando os que insistem na conveniência e covardia da desigualdade. Sem que percebam que este caminho se esgotou e hoje representa muito mais ameaças que oportunidades.
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