Equívocos das privatizações

José Eloy dos Santos Cardoso *
O Brasil é, na realidade, o grande país das oportunidades. Principalmente para estrangeiros. Basta ver que, só ao anunciar a possível privatização da Cemig já apareceram 8 candidatos. A venda dessa empresa, que é um “xodó” dos mineiros porque foi criada pelo saudoso presidente Juscelino Kubitschek quando governou Minas Gerais e teve como seu primeiro presidente o engenheiro Lucas Lopes, foi e continua sendo uma das responsáveis pelo desenvolvimento mineiro desde sua fundação. Agora, está sendo listada como vendável pelo governador Romeu Zema com o irrestrito apoio do ministro da Economia Paulo Guedes. Conheço essa empresa desde sua fundação e sou totalmente contrário a sua privatização porque, se for bem administrada e não servir de moeda política, sempre dará excelentes retornos financeiros ao governo sob a forma de dividendos. Aloísio Vasconcelos, ex-diretor da Cemig e ex-presidente da Eletrobras, também é contra a privatização. Inclusive, em entrevista recente ao DIÁRIO DO COMÉRCIO, justificou técnica e financeiramente porque é contrário à sua privatização.
Como economista e técnico de empresa que foi uma das responsáveis pelo desenvolvimento mineiro nos anos 70, 80 e 90, jamais concordarei com a venda de empresas de infraestrutura econômica como a Cemig, Copasa, Codemig e sua cria que foi a Codemge. A Cemig e a Codemig são empresas que dão lucro. No governo de Fernando Pimentel, dividiu-se a Codemig em duas para poder permitir vender parte da Codemig, que recebe grandes quantias que resultam das explorações do nióbio de Araxá. A riqueza que é o nióbio permitiu à Codemig construir a Cidade Administrativa e a Sala Minas Gerais de concertos. Essas obras foram feitas pela Codemig e, praticamente, sem ter nenhuma ajuda do governo para esses investimentos. Não se justifica tecnicamente vender ativos rentáveis para se pagar despesas de custeio como a folha dos funcionários públicos.
O jornalista Cesar Vanucci, em recente artigo publicado no DC, disse que a privatização da Cemig é “fora de propósito”. Aloísio Vasconcelos, que já foi secretário de Estado em Minas Gerais e deputado federal, conhece bem a Cemig. Foi também seu diretor. Na edição de 18 de setembro passado, fundamentou com muita precisão o grande equívoco da pretendida venda da Cemig. Sua privatização poderia ajudar ao governo Zema a quitar os atrasos existentes nos pagamentos ao funcionalismo mineiro, mas o dinheiro se esgotaria em um prazo de 3 anos, no máximo. Em dois anos, Minas terá condição de receber dividendos da Cemig equivalentes ao que se gasta com o funcionalismo. Entretanto, como dizemos comumente, o Estado ficaria a “ver navios de qualidades do passado”, enquanto outros estados e países do exterior fazem os modernos transatlânticos para navegar, e a nós só restaria, no máximo, pedir uma carona.
O vice-governador Paulo Brant, que é engenheiro e economista, e foi meu companheiro de magistério na PUC-Minas, sabe que tenho razão, mas não pode por razões políticas passar por cima do governador. Tanto Zema quanto o ministro Paulo Guedes são empresários de sucesso e, numa empresa privada, se existem ativos sobrando que não produzem lucros, pode-se descartar parte deles para pagar despesas de custeio para cobrir prejuízos. Se existe no caso empresarial uma alavancagem financeira negativa, se o exigível passivo atual está pedindo, vende-se a disponibilidade para pagar a dívida. Entretanto, na área pública, a coisa é muito diferente. Na administração pública, ao contrário da administração privada que só existe para dar lucros, os governantes são obrigados a melhorar ou aumentar o bem-estar e a satisfação coletiva. Esse deve ser objetivo de qualquer administração de governos de qualquer nível administrativo: federal, dos estados e dos municípios.
O governo mineiro construiu várias obras importantes através dos recursos da Codemig como a Cidade Administrativa e a Sala Minas Gerais, palco de importantes artistas e da Orquestra Sinfônica Mineira. É claro que a Codemig cometeu também vários equívocos como é o Expominas Juiz de Fora, hoje também apelidado pela população de “elefante branco”. Vender o Expominas JF será ótimo, mas não haverá muitos empresários dispostos a investir em um ativo que só dá prejuízos na atualidade. A venda da Codemig, ou parte dela, também será um equívoco porque se ela não conseguiu ser uma empresa de desenvolvimento econômico para honrar o próprio nome, aí o problema não será técnico, mas político com certeza.
*Economista, professor titular de macroeconomia da PUC-Minas e jornalista
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