Evolução ou involução semântica

Carlos Perktold *
Como todos sabem, nosso presidente não é um primor na linguagem diária quando dá entrevistas para a mídia ou quando discursa para o grande público. Ele prefere a língua do povão, aquela de uso cotidiano do homem comum, pouco requintado intelectualmente e que, se algum dia foi leitor, esse ser em extinção há muito deixou o hábito da leitura.
Para os eleitores que já viram um sociólogo poliglota na Presidência, professor da Sorbonne em Paris por imposição ditatorial, autor de vários livros, um intelectual brilhante que fala e escreve com elegância, simplicidade e clareza, seguida de um operário eleito para o mesmo cargo, que não gosta de ler, fala para o mesmo povão, mas com menos palavras chulas e tinha ideias esquisitas sobre nossa história (“Tiradentes foi crucificado”), é de se notar que houve uma (in) evolução semântica na Presidência. Não se trata aqui daquela de chamar câmara fotográfica de “Kodak”, nem de chamar aparelho de som de “radiola”.
O que vemos diuturnamente é Bolsonaro não se importar em utilizar anglicismo como “táokei?”, nem com a “porra da árvore” e menos ainda “com sua mãe”, referindo-se a alguém que lhe perguntou sobre o paradeiro do desaparecido Fabricio Queiroz ou com a palavra “sacanagem”. Este linguajar não é apropriado para a Presidência do País, que deveria seguir “a liturgia do cargo” expressão do ex-presidente Sarney, aquele da inflação de 80% ao mês. Mas Bolsonaro faz o maior sucesso entre o povão que sabe o significado de tudo isso e sente o mesmo que o presidente na hora que este percebe ser necessário ser agressivo verbalmente. Não se devem temer as palavras, é o claro recado na literatura e que a Presidência leva ao pé da letra quando nomeia as coisas com os nomes conhecidos pelos eleitores.
A (in) evolução semântica ocorre também com certo americano-brasileiro com influência sobre os Bolsonaros e que se autodenomina filósofo. Aqui nesta página e apesar deste autor não temer as palavras, não é possível reproduzir o que Olavo de Carvalho já falou e fala sobre Caetano Veloso e o que já mandou de recado para ele, tão baixo nível e chulas são suas mensagens. De longe, Olavo insiste em ofender o nosso compositor de primeiro mundo. Com seus twiters, ele é um silogismo falso no qual os filósofos deixaram de pensar e valorizar outros segmentos intelectuais e agora escrevem pornografia.
Em recente entrevista, Fabricio Queiroz segue a mesma escola e compara o que o MP prepara para ele e o filho 03 como “um cometa pra enterrar na gente”, acrescentando que o cometa é um phalus que o deixaria arrasado pra sempre. Medo ou desejo? That is the question.
Bons tempos aqueles que os filósofos nos ensinavam a pensar, a descobrir as falsas premissas em silogismos suspeitos e a recomendar a leitura de clássicos na literatura e a descrever a relação entre Sócrates e Platão ou a falar de Artur Schopenhauer, que minha geração julgava misógino, mas era alguém que amava as mulheres e achava que elas seriam maiores e melhores que os homens no futuro. Hoje, ele acharia que o futuro chegou e sentiria horror da linguagem do homem de Virginia.
O pior dessa (in) evolução semântica é que ela vai fazendo escola entre o povão que acha natural falar palavras descartáveis, também entre os eleitores que as repetem e nas redes sociais, que atingem público de toda natureza. Chegará o momento em que a (in) evolução semântica crescerá tanto que vamos julgar vantajoso dizer o máximo de bobagem no mínimo de palavras chulas.
*Psicanalista e escritor
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