Fevereiro Laranja e Roxo

As cores da “determinação”e “mistério”são as que caracterizam a tintura do mês de fevereiro para conscientizar as doenças colocadas sob holofote neste mês. Atribuir uma cor a um determinado mês para falar de algum tema de Saúde foi uma iniciativa bem-sucedida de campanhas que se iniciaram no final da década de 40 do século passado e proliferaram por seu forte apelo pelo bem comum. São muitas as circunstâncias de saúde que merecem relevância,e os destaques variam de país para país de acordo com suas prioridades.
Neste segundo mês do ano, entre nós, a cor alaranjada é para lembrar da Leucemia, e roxo para Lúpus, Fibromialgia, e Alzheimer. Daí, o título para fazer contraponto. É que dá até inveja, ou talvez nostalgia do viver de outrora, o viço exuberante nos versos da canção de Lenine/Queiroga citados na epígrafe. Eles demonstram o sentimento de completude quando se está bem. Posso explicar. A perda de energia expressada nas queixas de sensação de fraqueza, e fadiga comuns às três primeiras condições citadas são capazes de fazer enxergar a vida diferente. Lembram-se do encanto provocado quando passamos das fotos preto e branco para as coloridas? Pois é. Na doença voltamos ao preto e branco.Assim, nas doenças citadas a Qualidade de Vida e as habilidades de se cuidar de forma independente, sejam os afazeres de casa, pessoais ou profissionais ficam comprometidas.
Os temas são extensos e por isso elegi falar um pouco da Fibromialgia, doença que afeta de dois a oito por centro da população, mas que causa um forte impacto na Saúde pois consome muitos recursos de assistência em todos os seus aspectos. Sessenta a noventa por cento são mulheres acima de 45 anos e vários eventos pode servir de gatilho para o surgimento das queixas. Para começar, é importante contar que o diagnóstico é difícil. Tanto que a concordância até mesmo entre os especialistas é frequente, cerca de 75% somente. Não é de se assustar. É que os critérios diagnósticos podem ser interpretados de forma diferente por diferentes profissionais ou a história e exame clínico estavam mais voltados para uma direção que outra naquele dia. Além disso, muitos sintomas são comuns a muitas outras condições e podem gastar exames laboratoriais sequenciais, e tempo de observação para se chegar a uma conclusão.
Os principais sinais e sintomas são distúrbio do sono (em 70% dos casos), fraqueza dos braços e das pernas (50% dos casos),ansiedade, depressão, irritabilidade intestinal,tendência a empachamento (devido esvaziamento lento do estômago), prisão de ventre, rigidez matinal, fadiga,e obesidade.
Dentre as causas atribuíveis pode haver uma predisposição genética:enzimas “preguiçosas” até onze vezes mais lentas, alteram o metabolismo de neurotransmissores, e predispõem a um estado de hipersensibilidade. Assim, estímulos habitualmente não dolorosos representam agressão para aqueles indivíduos.Sabe-se que 70% das alterações dos genes dos pacientes fibromiálgicos são comuns a desordens psicológicas como ansiedade e depressão. Outros 40% dos genes são comuns a desordens que causam hipersensibilidade à dor, enxaqueca, doenças imunológicas, problemas circulatórios ou alterações metabólicas.
Outra hipótese é que os fibromiálgicos possam ter um aumento da pressão dentro do sistema nervoso central. Isto explicaria certos sintomas tais como dor de cabeça, perda da audição, zumbido, tonteiras, rouquidão, alteração do olfato, nariz escorrendo por rinite não alérgica, alterações visuais, visão dupla, olho seco, bruxismo devido hipertonia dos músculos da mastigação, e que leva também a dor na articulação tempomandibular (ATM).Esta pressão intracraniana aumentada também desencadearia a dilatação das bainhas de certos nervos (condição conhecida como cistos de Tarlov). Para se ter uma ideia, somente no máximo 9% da população geral têm esses cistos, mas nos pacientes com fibromialgia eles estão presentes na incidência de 40% nas mulheres e 12% nos homens.Isto seria a principal causa das dormências nos membros e dores nas costas destes pacientes. Tanto que em 90% destes pacientes o exame de eletroneuromiografia dos membros pode conter alterações.A dor não explicada,frequentemente atribuída à Depressão é discutível. Não seria a Depressão consequência dos nervos doentes? É uma discussão bem conhecida: quem nasceu primeiro: o ovo ou a galinha?.
Destarte, estamos longe da elucidação deste enigma. É provável que com o avanço dos conhecimentos grupos distintos de doenças sejam reconhecidas, e assim venhamos a diagnosticar diferentes condiçõesnestes pacientes com sintomas aparentemente comuns entre si. À medida que se aprimorar o diagnóstico então será possível melhorar as proposições de cuidados ideais – medicamentosos e não medicamentosos. Hoje, menos da metade dos pacientes respondem habitualmente aos tratamentos habituais. Para não dizer que diferentes sistemas da saúde respeitáveis mundo afora não reconhecem as estratégias de tratamento com unanimidade, fatos bem conhecidos e testemunhados qualquer que seja a doença.
É ainda importante lembrar que em tempos de uso ampliado de antibióticos devido a pandemia, alguns tiveram sua bula enriquecida em 2018 com efeitos adversos adicionais que sugerem a Fibromialgia, pelo órgão americano de controle de medicamentos (FDA). Dentre os citados estãoa amoxacilina, a azitromicina, e os da classe das fluoroquinolonas.
Para finalizar, deve-se enfatizar que o Covid-19 tornou-se uma nova fonte de referência pós-traumática seja do ponto de vista psicológico, psiquiátrico ou neurológico. Muitos pacientes desenvolvem sintomas diversos semelhantes à Fibromialgia cerca de seis semanas após terem tido a doença. Somente a educação continuada capacitará pari passo os profissionais da Saúde, e os pacientes que carregam este sofrimento,diante de um mundo com novos desafios e transformações. Queremos novamente um mundo colorido.
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