José Alencar, juros, risco Brasil etc

Cesar Vanucci *
“Estamos encabrestados. Caímos numa armadilha, numa arapuca.” (Pronunciamento de José Alencar em 2003)
As ponderações vindas a seguir respondem a pedidos de leitores que, atentos a narrativas aqui recentemente estampadas, expressaram interesse em conhecer outras manifestações do saudoso José Alencar Gomes da Silva relacionadas com causa do desenvolvimento brasileiro.
No exercício da vida pública, José Alencar repetiu centenas de vezes, para plateias receptivas de todas as categorias sociais, com o intuito de ser escutado, naquele estilo didático e vibrante todo seu, sensatas considerações sobre os caminhos brasileiros a serem trilhados na rota do desenvolvimento econômico e social. Sabia exprimir com certeira precisão o que a sociedade aspira. Interpretava magistralmente o sentimento das ruas com ideias como estas, transmitidas numa comemoração (2003) do “Dia da Indústria”, na Fiemg, repetindo conceitos amiúde transmitidos, há anos, como consagrado líder empresarial:
“Sempre condenamos os elevados preços de obras públicas e de compras do Estado. Os negociadores são, historicamente, generosos, ainda que probos e bem-intencionados. O mesmo acontece nas negociações brasileiras com a banca credora nacional e internacional e com essa coisa chamada mercado.”
Em 2003, já ocupando a Vice-Presidência da República, voltou a chamar a atenção de todos quanto à capacidade nacional de honrar suas contas. Suas observações estavam calcadas, na verdade, em dados preocupantes. “Temo que possamos chegar a um momento em que tais contas fujam de nosso controle, infladas pelas taxas de juros, em dimensão crescente, como vem acontecendo.” Pediu que as atenções ficassem focadas no que classificou como o verdadeiro “risco Brasil”, traduzido em números emblemáticos. Os juros – ressaltou – alcançaram a cifra de 44.9 bilhões de reais no primeiro semestre deste ano, contra 23.5 bilhões em igual período de 2002 e 17.8 bilhões no primeiro trimestre de 2001. Com base no acontecido nos doze meses de 2001 e 2002, JA projetou, então, por analogia, o que poderia vir a suceder em 2003. Em 2001, os juros somaram 86.4 bilhões, valor equivalente a 4.8 vezes os gastos verificados no primeiro trimestre do mesmo exercício. O valor foi outra vez multiplicado por 4.8 em 2002, chegando-se aos 114 bilhões de reais nos dispêndios efetivados. Conclusão da análise, reconhecidamente atual, emitida por conhecedor experimentado da realidade econômica:
“Gastamos de juros, em janeiro e fevereiro de 2003, 44.8 bilhões de reais que, multiplicados por 4.8, a seguir os exemplos de 2001 e 2002, nos levarão a alcançar, no final do ano, somente em despesas com juros sobre a dívida pública brasileira, a fabulosa soma de nada menos que 215 bilhões de reais, quase o dobro dos gastos verificados em 2002, um terço da carga tributaria nacional.”
José Alencar chegou a admitir, à época deste pronunciamento: “Estamos encabrestados. Caímos numa armadilha, numa arapuca”. Mas apontou saídas. Não saídas heterodoxas, inadequadas para o caso. Apostou, uma vez mais, apoderado da contagiante esperança que sempre norteou em tudo sua postura diante da vida, na saída clássica, na solução óbvia para a correção de rumos: trabalho, muito trabalho, com ênfase para o aumento da produção e crescimento do comércio externo.
“Precisamos colocar as atividades-meio a serviço da produção, da geração de empregos, objetivando uma melhor distribuição da renda nacional.” Resumiu a proposta num receituário de fácil compreensão: “Superávit de contas externas pelo incremento das exportações, substituição competitiva das importações para propiciar a queda ou até mesmo a eliminação do chamado “risco Brasil”, com a consequente redução da taxa de juros, abrindo espaço para os investimentos em atividades produtivas, gerando emprego e distribuição da renda nacional, para fazer justiça aos que trabalham e constroem a grandeza do País.”
Alertas desse gênero, ele os formulou, centenas de vezes, numa pregação dir-se-á apostólica, ininterrupta, carregada de brasilidade, timbrada pelo bom senso, conhecimento de causa e lucidez nas ideias.
JA inspirava-nos, a todos nós, a manter acesa a esperança no Brasil. Num Brasil melhor, que ele, de alguma maneira, tanto dentro quanto fora do governo, ajudou afinal de contas a construir.
- Jornalista ([email protected])
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