Landell teve seu momento de Galileu

Cesar Vanucci*
“Os inventos não mais me pertencem!”
Padre Landell Moura)
Como revelado em comentário anterior, Roberto Landell Moura requereu e obteve as patentes de alguns inventos durante sua permanência nos Estados Unidos. A divulgação de seus feitos atraiu a atenção de empresários norte-americanos, que lhe propuseram parceria para a produção industrial dos aparelhos concebidos. O padre-inventor brasileiro recusou, entretanto, a chance que se lhe ofereceram de tornar seu fabuloso trabalho conhecido em ampla escala. A atitude assumida contrastou com a de outros inventores geniais, como Thomas Edison e Alexander Graham Bell, que se fizeram celebridades mundiais graças a portentosas criações técnicas naquele preciso momento de pronunciada efervescência científica vivido pela nação norte-americana. Assinalou, candidamente, a propósito, o seguinte: “Os inventos já não mais me pertencem! Por mercê de Deus, sou apenas o depositário deles. Vou levá-los para minha pátria, o Brasil, a quem compete entregá-los à humanidade”.
Fica difícil avaliar o tamanho de sua frustração! As lideranças brasileiras não se sensibilizaram nadica de nada com essa manifestação de idealismo, desprendimento e civismo. De volta ao Brasil, designado pároco de Botucatu, requereu, esperançoso, recursos oficiais para a continuidade do trabalho e lançamento dos inventos em proveito comunitário. Os apelos não encontraram eco. Reivindicou do governo Rodrigues Alves que disponibilizasse dois navios da Marinha para um teste pioneiro no mundo de transmissão sem fio a longa distância. O pedido foi rejeitado com desdém. Houve no alto escalão quem classificasse Landell de “maluco”.
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Abra-se aqui parêntese para anotar que, mais ou menos na mesma época, navios da Marinha dos Estados Unidos foram cedidos a inventores estadunidenses para pesquisas assemelhadas.
Os obstáculos antepostos à ação vanguardeira de Landell causaram-lhe compreensível desgosto. Mas não o esmoreceram. Sua capacidade inventiva manteve-se incólume. Seu diálogo com o poder político e superiores religiosos mostrou-se, inúmeras vezes, tumultuado e tenso. Mas ele conservou-se confiante na empreitada de contribuir para o engrandecimento da ciência e a inclusão do Brasil “na ampla e ilimitada esfera dos modernos cometimentos científicos”. Dizia sempre que seu trabalho visava abolir superstições e fortalecer a fé. A declaração vinda abaixo é emblemática: “Desejo mostrar ao mundo que a Igreja Católica não é uma inimiga da ciência e do progresso humano. Indivíduos da Igreja podem num e noutro caso ter se oposto à luz, mas fizeram-no na sua cegueira pela verdade católica. Eu próprio já deparei com grande oposição de meus companheiros de fé. No Brasil, um populacho supersticioso, afirmando que eu tinha partes com o diabo, invadiu o meu gabinete e destruiu o meu aparelho. Quase todos os meus amigos de educação e camaradas intelectuais, seculares e leigos indiferentemente, consideram as minhas teorias contrárias à ciência. Sei bem o que é sentir como Galileu e exclamar como ele: “E pur si muove”. Quando todos eram contra mim, eu contentava-me em conservar-me no meu terreno, e dizia: É assim; não pode ser de outro modo”.
A “Wikipédia” registra outros trechos eloquentes e sugestivos da visão científica desbravadora de Landell. Estes ditos seus são de 1893. “Todo movimento vibratório que até hoje, como no futuro, pode ser transmitido através de um condutor, poderá ser transmitido através de um feixe luminoso; e, por esse mesmo fato, poderá ser transmitido sem o concurso desse agente. (…) Todo movimento vibratório tende a transmitir-se na razão direta de sua intensidade, constância e uniformidade de seus movimentos ondulatórios, e na razão inversa dos obstáculos que se opuserem à sua marcha e produção. (…) Dai-me um movimento vibratório tão extenso quanto a distancia que nos separa desses outros mundos que rolam sobre nossa cabeça, ou sob nossos pés, e eu farei chegar minha voz até lá.
Voltaremos a falar do extraordinário vulto da história brasileira na sequência.
- Jornalista ([email protected])
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