Medicina de Precisão

Já de longo tempo não nos causa espanto a substituição de uma tecnologia por outra mais moderna. Este avanço é sustentado por novas descobertas e conhecimentos. O mesmo acontece com as verdades da Medicina. Em 1950 estimava-se que pelo menos metade do que se sabia teria uma validade de cinquenta anos. Em 1980 este tempo caiu para sete anos, e hoje podemos ser surpreendidos com um ponto de vista diferente em menos de noventa dias.
Alicerçados em big data – imensa quantidade de informações que o cérebro humano não é capaz de processar – e aliados às novas ciências resultantes do desvendamento dos genomas, vemos emergir a promessa de diagnósticos mais precisos e tratamentos revolucionários em todos os campos da Medicina. Os novos recursos de sequenciamento dos genes são capazes, por exemplo, de alterar em cinquenta por cento dos casos, as decisões do melhor remédio para o câncer da mama ou do trato biliar. A possibilidade de oferecer um tratamento que se encaixa às características genéticas é uma nova esperança para os que podem usufruir desta oportunidade. Considerando que a idade média das pessoas nestas circunstâncias é de 56 anos, cada dia da extensão da jornada da longevidade conta.
A integração progressiva e continuada dos dados sobre quais remédios são melhores para cada pessoa – uma ciência chamada farmacogenômica – juntamente a todas as demais informações sobre um paciente, desde idade, sexo, local de nascimento, profissão, hábitos de vida, anexação de todos os dados porventura acumulados ao longo do tempo em seu relógio smartwatch etc., traçados de quaisquer exames gráficos, seja eletrocardiograma ou outros, sejam imagens de exames tais como radiografias, tomografias ou ressonâncias se tornou realidade. Tudo pode ser transformado em equações matemáticas chamadas algoritmos para ser analisado e contribuir para um melhor prognóstico com conduta mais adequada.
Um exemplo atual de uso de nova tecnologia é a prescrição dos medicamentos da classe das tiopurinas, usados em dezenas de doenças tais como leucemia, doença de Crohn (no intestino), artrite reumatoide, após transplantes de órgãos etc. Quem não tem a enzima TPMT em percentual funcionante pode apresentar efeitos adversos graves ou toxicidade. Hoje, após o advento do exame de investigação do perfil genético para a detecção da mutação que leva à diminuição de atividade desta substância, todos se sentem mais seguros, pacientes e médicos prescritores. O exame é feito pelo método chamado NGS – “sequenciamento de nova geração” – capaz de fazer o sequenciamento do DNA. Ouviremos doravante falar muito dele, pois tem serventia em várias circunstâncias tais como detectar mutações genéticas em pacientes com câncer, checar a adaptação de várias drogas a condições específicas, dentre outras.
Outra sigla com a qual passamos a conviver desde 2002 e será do nosso cotidiano é a CRISPR (clustered regularly interspaced short palindromic repeats: repetições palindrômicas curtas agrupadas e regularmente interespaçadas). Em linguagem simples, é essa técnica de engenharia genética que permite a edição dos genes. Os cientistas desenvolveram esta “ferramenta” para esta função pela primeira vez em 2011. É como trocar as letras de uma palavra e ela então ter um novo significado. No caso do gene ele terá sua função restabelecida ou modificada de acordo com a necessidade. Desde então, abriu-se novas perspectivas para se tratar uma série de doenças, como certos tipos de câncer, leucemia, HIV, anemia falciforme etc.
Os bancos de dados de genes do mundo inteiro compilam as informações de que gene sintetiza cada proteína, ou faz qual função que pode ser determinante para se desenvolver uma certa doença ou condição. Dos cerca de sessenta mil genes compilados um terço é responsável por codificar substâncias cruciais para o nosso corpo. Estes cerca de vinte mil genes representam apenas 1,5 % de todo o genoma humano. Há muito ainda por vir.
A expansão dos instrumentos de pesquisa avançados tais como a inteligência artificial (AI) concedeu acessibilidade às informações que catapultam as inovações, e a possibilidade de proposição de novas estratégias para situações em que não se vislumbrava uma solução. Exemplo claro é a descoberta que certas drogas bem conhecidas para uma condição podem servir também com êxito para outras situações aparentemente tão diferentes. Testemunhamos isto recentemente na epidemia de Covid-19.
Entretanto não se pode perder de vista que a manifestação de muitos genes está condicionada a fatores externos, tais como o modo de vida, alimentação, exercício físico, paz de espírito, e até mesmo o ar que se respira. Todos os fatores podem atuar como gatilho para a perda da higidez. Se estamos nos cuidando bem é sinal de que estamos nos respeitando e nos amando. Que assim prossigamos. Cada um é muito importante aqui. Quando canta “Saúde”, Rita Lee, na composição dela e Roberto de Carvalho nos deixa esta mensagem alvissareira: “Mas enquanto estou viva e cheia de graça/Talvez ainda faça um monte de gente feliz”. Que assim seja!
Ouça a rádio de Minas