Mindset e sustentabilidade

Sidemberg Rodrigues*
Enquanto o “big data” com suas “referências cruzadas” inspirava Hollywood em filmes como “O Círculo” (2017) e influenciava até a eleição do polêmico Trump, o planeta consolidava a era startup. O paradigma, nem tão novo assim à época, prometia elevar as performances no menor tempo e realmente revolucionar, com soluções modulares, integráveis e encurtadoras de caminhos. Ganha-se em tempo, inovação e custos. E é na dimensão Cultural da sustentabilidade onde parece estar o pulo do gato. O que todos os lugares com sucesso nesse aspecto tiveram em comum foi a hipervalorização do empreendedorismo juvenil e da liberdade de criação, não necessariamente vinculadas ao mundo acadêmico, embora guiadas pela pesquisa sistemática e pela interconexão imaginativa.
O segredo estava em um novo mindset (ou configuração mental), que favoreceu alternativas revolucionárias, mas exigiu radicais mudanças de visão e direção. Algumas empresas saíram à caça de soluções mágicas na tentativa de inovar sem, contudo, mudar a própria cabeça. Algumas encontraram um bom caminho. Outras não. Depois de criarem centros de pesquisa e desenvolvimento, começaram o garimpo externo, pois as promessas de se conectar soluções prontas, através do compartilhamento de práticas entre fontes diversas (ecossistemas), ao invés de concentrar a inteligência “in house”, parecia o Nirvana da gestão. Um equívoco pensar que o universo startup circunscreve-se a produtos e serviços.
Em essência, é uma ‘mentalidade’. Uma peculiar e complexa mudança cultural que exige transformação de consciência para impactos positivos no comportamento e na atitude, que o imediatismo do curtíssimo prazo pode colocar a perder. A expectativa de se lançar desafios para que as incubadoras construam mágicas instantâneas ou para que um “search” no “ecossistema” encontre na prateleira das panaceias a solução revolucionária e barata – que vai funcionar como a peça que faltava para o sucesso empresarial – pode estar muito longe do que acontece na prática. Integrar soluções de vanguarda ao universo dos legados nas organizações pode resultar em incompatibilidades processuais, tecnológicas, sistêmicas e, acima de tudo, humanas.
Vide exemplo de organizações tradicionais que acharam que inovavam amontoando funcionários e gestores em salas comuns, sem antes promover o espírito integrativo e a reciclagem mental que essas propostas exigem. Sem coerência, consistência e um preparo cuidadoso, tudo pode terminar em um mar de frustrações ou num Frankestein improdutivo, com gente perdida, falando demais, produzindo de menos, conforme se viu até meados de 2019. Especialistas sem saber o que fazer debaixo das cores de Almodóvar das paredes e com o excesso de liberdade em suas bermudas estampadas a surfarem em incompreensíveis rotinas. Um acabava atrapalhando o outro ao invés dos times se autoenergizarem.
A nova cultura a ser inoculada nos ambientes pela filosofia startup recomenda a descentralização e a descompactação, das quais o militarismo empresarial parecia longe de se libertar. Podem boicotar o sonho líderes intempestivos, castradores e retrógrados, que só veem o produto (e nunca o cliente); que olham para muros e segmentos (sem ver a empresa como um todo), ou que nadam na falta de empatia. Além disso, há os encantados pela vaidade, priorizando apenas o seu nome nos espaços de fala dos eventos, nas manchetes ou que acha mais importante caçar seguidores nas redes sociais (com filminhos da moda) do que inspirar pessoas. Esses também estão longe do estilo de liderança da cabeça realmente disruptiva.
Há, ainda, o medo de comutar conhecimento e perder espaço nas organizações. Se nem dentro de um mesmo grupo empresarial dispõem-se e oferecer oportunidade para que todos evoluam em conjunto, imagine abrir-se ao universo startup?! Mas a coisa evoluiu. Muitas organizações decolaram e estão em patamares razoáveis de evolução. Outras ainda patinam… Até que ponto o maior empecilho da evolução Cultural da sustentabilidade empresarial não estaria na dimensão Espiritual (o próprio sujeito), que pode até se encantar com os ventos da vanguarda, mas resiste em aceitar que a maior revolução depende, sobretudo, de sua própria disposição de mudar.
*Conferencista, articulista e professor de Sustentabilidade, Gestão e Integridade em cursos MBA. Autor dos livros: Espiritual & Sustentável (sustentabilidade em 6 dimensões); Complementaridade (gestão sustentável) e Miséria Móvel (crítica social). Contato: [email protected]
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