Na COP 26, o protagonismo da sociedade

Sob o olhar atento e vigilante do mundo, encerrou-se a COP 26 – Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática – UNFCCC. É um nome e uma sigla cujo significado talvez pouca gente conheça. No popular, como se costuma dizer, por sua importância crucial para a humanidade, é chamada de Conferência Mundial do Clima, Cúpula da Terra, Cúpula da Vida, Conferência das Partes ou, simplesmente COP. Todo mundo interessado na sobrevivência do planeta sabe muito bem o que significam estas três letrinhas.
Realizado em Glasgow, na Escócia, durante 15 dias, o encontro reuniu 195 países de todos os continentes, porte e importância econômica e social – e o Brasil estava lá, naturalmente em destaque, em razão de sua biodiversidade, da Amazônia, de sua flora, de sua fauna, de sua economia e de sua política ambiental. Neste momento de reflexão sobre tudo que aconteceu em Glasgow, a pergunta é: quais são as conclusões e consequências da COP 26? Avançamos? Retrocedemos?
Penso que o caminho do meio, do equilíbrio e da transigência, é sempre melhor que o sectarismo e o radicalismo deletérios que nada constroem. Certamente não chegamos aonde gostaríamos, mas demos passos adiante, e importantes, no objetivo de construir uma sociedade mais sustentável na economia, na política e nas relações sociais. Pela primeira vez, questões cruciais foram enfrentadas objetivamente, como a regulação do mercado de carbono, redução de subsídios aos combustíveis fósseis e erradicação do desmatamento até 2030. Falhamos na tentativa de assegurar financiamentos mais substantivos dos países ricos aos mais pobres visando à adoção de medidas de sustentabilidade. Falhamos, igualmente, ao não estabelecer regras efetivas focando a redução do uso do carvão mineral, defendido especialmente por dois dos países mais populosos do planeta – China e Estados Unidos -, que, na contramão da vontade mundial, negaram-se a assumir compromissos nesta direção.
Um aspecto, no entanto, me anima a afirmar que a COP 26 foi um grande sucesso – o protagonismo assumido pela sociedade nos debates, na apresentação de soluções e nas cobranças visando à implementação destas soluções. O Brasil destacou-se com dupla presença: o estande oficial do governo, de onde partiram decisões importantes, como compromissos com o fim do desmatamento e apoio à regulação do mercado de carbono; e o assim chamado pavilhão da sociedade civil, o Brasil Climate Action Hub. Neste estande estavam CEO´s das maiores empresas brasileiras assumidamente comprometidas com a bandeira da sustentabilidade, organizações não governamentais e lideranças políticas como governadores, senadores e parlamentares.
O protagonismo da sociedade é, de fato, acontecimento a celebrar, pois é dela – a sociedade – que emanam conquistas acumuladas desde Estocolmo (Suécia), em 1972, também em uma reunião sobre o meio ambiente, quando o conceito predominante era o de que antes de cuidar do meio ambiente era preciso fazer o bolo da economia crescer. Este falso dilema, que abdica exatamente da possibilidade e viabilidade do desenvolvimento sustentável, provocou danos terríveis, que hoje, com iniciativas como a COP, buscamos corrigir. Felizmente, estamos conseguindo, com a convicção de que, como em 1972 e ao longo de anos e décadas, o fator determinante do êxito nesta cruzada é e sempre será a sociedade – cada um de nós, todos nós.
Em essência, o que está em pauta nas tratativas das COP’s, desde a primeira – Berlim, 1995 – é a preservação do planeta e da vida que nele habita. Para nós, da comunidade formada em torno da ADCE, entidade pioneira no mundo a tratar da questão da responsabilidade social das empresas, é gratificante constatar que, historicamente, a Igreja está presente neste debate. No cenário deste ano, às vésperas da COP 26, o Papa Francisco alertou os dirigentes mundiais para a necessidade urgente de oferecer respostas eficazes para os desafios climáticos do planeta. Como nos lembra Dom Odilo Scherer, cardeal-arcebispo de São Paulo, na mensagem enviada ao presidente da COP, Alok Sharma, o Papa advertiu que “é hora de mostrar se realmente existe vontade política para destinar – com honestidade, responsabilidade e coragem – mais recursos para mitigar os efeitos negativos das mudanças climáticas e para ajudar as populações mais pobres e vulneráveis”. Por sua vez, o cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado da Santa Sé, ao falar em Glasgow, reafirmou a importância, a urgência e a emergência dos assuntos ali tratados.
Este, na verdade, é o posicionamento histórico do Vaticano, presente, antes, na encíclica Caritas in Veritate do Papa Bento XVI, de 2009, na qual alerta que a natureza está à disposição do homem, mas não para qualquer intervenção e uso. Bento XVI também alerta para o respeito a princípios e valores éticos nas relações com a natureza. Seis anos depois, na encíclica Laudato Sí, o Papa Francisco volta a abordar o assunto: ao considerar o mundo como a casa de todos nós, a casa comum, Francisco diz que cuidar dela é responsabilidade de todos – e que ninguém está dispensado de cumprir a sua parte.
Enfim, a COP 26 pode não ter alcançado todos os objetivos desejados, mas é certo que avançou ao estabelecer dispositivos incluídos no “Livro de Regras” aprovado ao seu final e que agora precisa ser cumprido. Também é fato que os resultados conquistados devem ser creditados principalmente à mobilização da sociedade civil. É uma mobilização que não pode se dissolver agora, pois é fundamental para garantir que os compromissos assumidos durante a Cúpula da Vida se transformem em efetiva realidade.
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