Opinião

Negócios conscientes são bons negócios

Negócios conscientes são bons negócios
Francine Póvoa | Arquivo Pessoal

Francine Póvoa*

Até bem recentemente, o conceito de consciência não era algo comum de ser debatido no mundo dos negócios, mas felizmente algo mudou nos últimos anos. Nossos desafios como sociedade se tornaram maiores e mais complexos demandando assim uma nova forma de conduzir empresas e uma nova forma de liderar, com muito mais consciência do propósito maior de um negócio, de suas relações com todos os stakeholders e seus impactos para o planeta.

Mas o que é um negócio consciente? É possível medir o nível de consciência de uma empresa? Como as  questões ambientais, sociais e de governança, reunidas na sigla ESG, podem favorecer a construção de um negócio consciente?

De acordo com a abordagem do Capitalismo Consciente, um negócio para ser considerado consciente precisa de quatro pilares: propósito maior, liderança consciente, orientação para stakeholders e cultura consciente. Estes quatro pilares são interdependentes e envolvem uma jornada evolutiva bastante desafiadora para a organização e suas lideranças, então é necessário ter clareza sobre quais são os resultados concretos e benefícios para que uma empresa se lance nesta jornada, incluindo os resultados financeiros, que são fundamentais para uma empresa ser perene.

Os primeiros estudos realizados entre 2006 e 2007 que visavam medir a performance financeira de empresas cuja gestão estava alinhada aos pilares do Capitalismo Consciente identificaram que elas superaram o índice S&P 500 na relação de quase nove para um em um período de 10 anos. Na segunda edição do estudo realizada em 2015 a proporção foi de 14 para um por mais de 15 anos para um conjunto de empresas.

Aqui no Brasil, a edição mais recente da pesquisa “Melhores para o Brasil” avaliou 198 empresas que foram classificadas considerando o rating ESG Humanizadas, que vai de um baixíssimo nível de maturidade ESG, o nível E, a níveis considerados extremamente alto, os níveis AA e AAA. Oitenta e quatro empresas foram classificadas em nível igual ou superior a BBB enquanto a média do mercado de brasileira fica entre CCC e B.

Quanto aos principais resultados de performance das empresas “Melhores para o Brasil” destacam-se:

• clientes e consumidores estão 98% mais satisfeitos;

• fornecedores e parceiros estão 95% mais otimistas com o futuro da parceria com estas empresas;

• as comunidades locais possuem satisfação 75% superior;

• possuem 164% maior atenção e cuidado com práticas ambientais;

• o retorno financeiro de longo prazo é 615% superior ao IBOV e ISE no período de dezembro de 2010 a dezembro de 2022.

Quando aprofundamos um pouco mais em temas ligados à agenda ESG há mais evidências de que vale a pena avançar. Um levantamento recente realizado por uma instituição financeira mostrou que o compromisso das companhias abertas da bolsa brasileira com a diversidade de gênero aumenta o retorno aos acionistas. A corretora calculou que uma cesta com ações das 15 empresas de capital aberto com mais mulheres no conselho de administração avançou 349% desde 2010, enquanto o Ibovespa ganhou 49% no mesmo período.

Outro exemplo está relacionado ao tema salário digno. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o salário digno leva em consideração em seu cálculo quanto a população em determinada região precisa de dinheiro para morar com algum conforto, realizar várias refeições ao dia, garantir acesso a água potável, educação, saúde e conseguir pagar as contas de energia e gás, ter vestimentas e meios de locomoção entre outras necessidades, incluindo a provisão para imprevistos. No Brasil, a estimativa é de que o salário digno seja em torno de R$ 3 mil, podendo variar por região.

Com o entendimento cada vez maior de que as empresas têm um papel fundamental no enfrentamento das desigualdades, algumas delas têm saído na frente e adotado o conceito de salário digno. Podemos citar o exemplo da multinacional de produtos de beleza L´Oreal, da fabricante de chocolates brasileira Dengo e outras 24 companhias que aderiram ao Movimento Salário Digno do Pacto Global da ONU no Brasil.

Um caso interessante a ser citado é o da empresa de pagamentos PayPal. Em 2018, a empresa apurou que 60% dos funcionários tinham renda disponível líquida (ou NDI, na sigla em inglês) entre 4% a 6% de seu salário, o que não daria para nenhum imprevisto. A empresa aumentou o NDI deles para 16% e elevou a contribuição para os custos de assistência médica, reduzindo o que os funcionários tinham de pagar em cerca de 58%. O salário em si subiu 7%, em média, e foi ainda oferecida a eles a possibilidade de comprarem ações da empresa ao longo do tempo. A empresa também ofereceu educação financeira para os funcionários aprenderem a administrar seu dinheiro. O resultado deste conjunto de medidas teve impacto direto na receita, que subiu 15% e o lucro, 28%, entre 2018 e 2019.

É necessário perceber de uma vez por todas que não é possível que negócios prosperem em uma sociedade que fracassa e que é possível unir propósito maior e resultado financeiro.

*Conselheira do Instituto Capitalismo Consciente Brasil – Filial BH, Diretora da Legacy4Business, Vice-coordenadora do Capítulo Minas Gerais do IBGC e professora convidada da Fundação Dom Cabral. Instagram @francinepovoa e Linkedin.

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