Opinião

O desmantelamento das universidades públicas

O desmantelamento das universidades públicas
Crédito: Divulgação

Os últimos governos que têm estado à frente dos destinos da sociedade brasileira desde o golpe sofrido pela presidenta Dilma Roussef têm tido um traço em comum: uma política de total negação da importância do sistema educacional brasileiro e, sobretudo, das universidades públicas. Prosseguindo com a política de cortes nos orçamentos destinados às universidades (2014, 2015, 2016, 2017, 2019, 2020, 2021), o governo fez aprovar, em maio de 2022, mais um corte, desta vez de 14,5%.

As consequências imediatas desse descalabro são extremamente nefastas. Em primeiro lugar, afeta o necessário suporte aos estudantes, através das bolsas de estudo, que garantem, sobretudo aos alunos em condições sociais vulneráveis, a possibilidade de formação profissional superior em uma instituição pública; mas afeta também a própria vida universitária: não só as atividades de ensino, mas de pesquisa e de extensão, fundamentais, todas, para a formação do futuro profissional. Afeta ainda todos os outros setores necessários para o funcionamento da universidade: área administrativa, contratos com fornecedores, manutenção de laboratórios, restaurantes universitários, contratação de pessoal de limpeza, de segurança. E talvez o mais grave: muitas das 11 universidades mineiras correm o risco de ser obrigadas a interromper suas atividades. Ou seja, um verdadeiro descalabro, um colapso total.

É sabido que as universidades públicas – e a educação de modo geral – vêm sofrendo, há muitos anos, um questionamento impensável e mesmo destruidor: esses governos veem a educação e a universidade pública não só como espaço de formação crítica e questionadora -e não suportam essa função da universidade – como também espaço de balburdia e malandragem. Querem pessoas que aceitem a sua visão e colaborem para a estabilidade do status quo, sem questionamentos.

No entanto, sabe-se muito bem que não se constrói um país sem um investimento contínuo e sustentável em educação, ciência, tecnologia e cultura, já dizia, em 2019, o gabinete da reitora da UFMG. E mais: “As universidades federais são, na verdade, patrimônio nacional, imprescindíveis para a construção de um país mais desenvolvido, mais justo e equânime, que ofereça melhores condições de vida para a sua população», diz nota da UFMG. E, acrescentando, que estabeleça um diálogo com o setor produtivo, no sentido de abrir um caminho de intercâmbio entre as empresas e a academia, de modo que o conhecimento científico produzido nas universidades possa responder às necessidades dos micros, pequenos, médios e grandes empresários, através de um diálogo, de uma parceria público-privada, articulada pelos governos, em nível federal e dos estados.

A UFMG tem procurado esse diálogo em várias instâncias, tanto privadas quanto públicas, atendendo às demandas específicas da sociedade, do mercado e Estado e tem se destacado nesse propósito. O projeto Brumadinho UFMG, por exemplo, desenvolvido por demanda do poder Judiciário, reúne informações técnicas produzidas com o objetivo de orientar decisões judiciais relacionadas ao desastre provocado pelo rompimento da barragem em 2019, além de possibilitar o acesso das pessoas atingidas a documentos relacionados aos processos. O núcleo Alternativas de Produção trabalha há mais de 20 anos com os catadores de papel e, nesse período da pandemia, desenvolve protocolos de trabalho, como o uso de máscaras pelos catadores e higienização dos materiais, o que possibilitou a retomada das atividades pela Superintendência da Limpeza Urbana (SLU) de Belo Horizonte.

No que concerne à parceria com o setor produtivo, a Faculdade de Química, por exemplo, através do seu Centro de Escalonamento e Modelagem de Negócios, cuja atuação é focada nas áreas de química, física e engenharia, busca novas tecnologias que possam ser levadas ao mercado, favorecendo os negócios, sobretudo no que concerne à transformação de resíduos ou rejeitos para o desenvolvimento de novos produtos e processos ligados à sustentabilidade, com mais de R$ 3 milhões em projetos com indústrias nacionais, em programas em parceria seja com o Senai (200 mil litros de álcool glicerinado); seja com a Samarco, com quem desenvolve programa para a destinação de resíduo gerado em refinarias do Peru, com apoio da Fapemig e da RHI Magnesita.

Outro programa importante (Rota 2030) é desenvolvido em parceria com a Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA), buscando métodos de estímulo à produção de tecnologias relacionadas à conectividade veicular, inovações em veículos autônomos, conectividade com o ambiente externo e com a infraestrutura dos centros urbanos e rodovias.

Edvaldo Vilela, ex-presidente da Fapemig e hoje presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), em entrevista ao DC- #juntos por minas (6/5/22, “O Brasil precisa estruturar e priorizar grande projeto de inovação para crescer”) afirma que a parceria entre universidades e empresas é fundamental para alavancar uma nova economia mineira, baseada, sobretudo, no conhecimento inovador no campo da educação tecnológica, com foco na profissionalização e na empregabilidade. Essa parceria, que pode favorecer também o crescimento industrial nos setores da saúde, do agronegócio, dos medicamentos, dos fertilizantes etc etc etc, favorece tanto o pesquisador, na ampliação do foco do conhecimento científico, quanto o empresário, que se torna capaz de aumentar sua competitividade no mercado, e ainda a própria sociedade civil, que se beneficia com os avanços científicos postos a serviços do setor produtivo, numa parceria cada vez mais inovadora e, esperamos, duradoura.

Nesse contexto, a política de desmantelamento das universidades, com seus cortes cada vez mais nefastos, não há de vencer…

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