O mundo é capitalista

André Menezes*
Sempre que reflito sobre como gerar impacto em larga escala no mundo, lembro que o mundo é capitalista. A grande maioria dos ativos sob gestão do mundo, cerca de 84%, está no segundo setor, ou seja, nas empresas/negócios, e somente 16% se encontram no primeiro ou terceiro setor. Mas, por que ainda acreditamos que cuidar dos impactos negativos, que geramos como sociedade, é responsabilidade somente do governo ou das ONGs?
Criamos uma expectativa falha. Embora o grande grupo líder em dinheiro no mundo seja responsável por quase todos os impactos negativos que encontramos, ficamos esperando soluções milagrosas vindas “sei lá de onde”. Precisamos entender como o dinheiro gera impacto e assim aprender a mitigar os impactos negativos, por um lado, e a ampliar o impacto positivo, por outro.
É nítido o poder de impacto do dinheiro. As decisões de como e onde colocamos os recursos financeiros do mundo definem e moldam nosso futuro. E isso vale não somente para os bilhões ou trilhões de ativos sob gestão comentados acima, vale também para o nosso bolso. Como você gasta ou investe o seu dinheiro? Uma das formas mais ativistas de mudar o mundo é fazer escolhas certas no micro momento quando decidimos adquirir algo ou onde iremos colocar nossos recursos.
Será que um banco deveria ser corresponsabilizado por atender uma conta bancária e realizar ótimos investimentos financeiros para grupos de tráfico de drogas? Qual o limiar que define essa corresponsabilidade do banco em uma ação como essa? E quando quem investe é uma pessoa física? Muitos grupos têm receios ao investir com impacto em petrolíferas, empresas de cigarro, empresas de armas, mineradoras e até empresas inovadoras da GigEconomy, mas como está a carteira dos investidores pequenos? É fácil encontrar investimentos focados no retorno financeiro, sobretudo de curto prazo, mas isso não é suficiente para prosperar no longo prazo. A prosperidade depende, também, de resultados socioambientais, além de financeiros. Por isso, um dos caminhos que vemos crescendo é o Investimento de Impacto, mas é preciso fomentá-lo, pensar sobre como o nosso recurso financeiro pode gerar impacto positivo.
O brasileiro tem um perfil de investimento: real estate, (afinal “quem compra terra não erra”, já dizia o ditado) e franquias (com um modelo pronto é mais fácil para um novato empreender). Precisamos buscar mais ativos para receberem investimento dentro dessas áreas mais conhecidas, mas com foco de impacto. No mercado imobiliário, já vemos investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento de soluções sustentáveis, afinal é o mercado que mais gera resíduo do mundo, cerca de 520 kg por dia por pessoa (para fins comparativos, nossa geração de resíduos residenciais é de cerca 1 kg por pessoa por dia). Construções sustentáveis, economia circular de resíduos de construção, contratação inclusiva com intencionalidade, entre outras, são alternativas em desenvolvimento. Nas franquias, processo e produtos mais sustentáveis vem ganhando forma, como uma alimentação mais natural e investimento em bem-estar.
Um ponto muito relevante onde podemos claramente gerar impacto é nas nossas escolhas rotineiras, priorizando compras sustentáveis de todos os tipos. Já existem sites especializados em mapear e fazer uma ótima curadoria de Negócios de Impacto. Comprar um chinelo ou sapato feito de látex da Amazônia, como da Seringô, que incentiva a proteção da floresta através de uma economia da floresta em pé, uma escova de dentes de madeira ou uma mochila sustentável da Patagônia já é um ato político em prol da mudança que esperamos no mundo. Vivemos em um país onde temos uma matriz de combustível bem mais limpa como o etanol, mas ainda tomamos a decisão de colocar gasolina caso o preço esteja com uma diferença menor de 70%. Porque fazemos isso? Porque priorizamos um combustível fóssil, com grande agressão ambiental e limitado no mundo por ser um recurso natural escasso, ao invés de uma cadeia mais robusta e sustentável? Claro que todos mercados tem seus impactos, mas podemos parar e refletir um pouco sobre nossas decisões de consumo como votos em prol do ESG.
Sempre que sobra um pouco de recurso financeiro colocamos nosso dinheiro em investimentos, dos tradicionais renda fixa e tesouro até os de mais risco como startups. Como escolher o banco mais sustentável para cuidar do meu recurso? Sabia que já existem no mundo bancos éticos, onde você escolhe o que o banco pode ou não pode fazer com o seu dinheiro? Faz todo o sentido, vale olhar o case do Triodos Bank do Joan Melé. Estão cada vez mais surgindo oportunidades de investimento em fundos ESG, grupos de investimento de impacto e ativos que geram impacto com seu recurso. Que tal mudar a forma de investir e, assim, gerar mais valor para você e para o planeta? Procure por soluções, e cuidado com o greenwashing, com investimentos fantasiados de impacto mas que, na verdade, somente possuem boas práticas ESG ao invés de ser realmente um investimento de impacto.
*Fundador da Baanko, gestor do grupo de investidores de impacto FDC Angels e Embaixador do Capitalismo Consciente
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