Opinião

Problemas sociais e insensibilidade política

Problemas sociais e insensibilidade política
Crédito: Freepik

“Brasileiro, profissão esperança.” (Peça teatral de Paulo Pontes)

O brasileiro é, antes de tudo, um forte. Imagino que Euclides da Cunha, descortinando a conjuntura social, econômica e política, não encontraria dificuldade em alterar ligeiramente o dito famoso do épico “Os Sertões”.

Recapitulemos o que anda pintando no pedaço. Fixemos o olhar na colossal carga de problemas despejada nos ombros da sociedade. Neste preciso momento, a pandemia ganha, obviamente, destaque nas preocupações. Quinto país mais populoso, ocupamos o segundo lugar em casos de contaminação e óbitos. A indesejável posição decorre de equívocos lastimáveis, num falar mais brando, cometidos na gestão político-administrativa da questão, conforme reconhecido por órgãos de credibilidade científica induvidosa. Ficamos lá pelo 50º lugar na execução, em meio à politiquice rasteira, no programa de vacinação. Vacinação insensatamente criticada por radicais e que caminha a passo de cágado. No amargo contexto há lugar ainda para insuficiência de leitos em UTIs, falta de oxigênio e de utensílios imprescindíveis na linha de frente assistencial.

Noutras vertentes dos transtornos inquietantes lá estão os impactantes índices de desenvolvimento humano. 27 milhões de brasileiros sobrevivem(?) com R$ 8,72/dia. Água encanada e rede de esgoto são recursos de infraestrutura básica inexistentes para cem milhões. E tome, além disso tudo, o crescente custo de vida, o desemprego, o subemprego, compondo quadro social atemorizante!

O confronto de tão flamejantes questões com as infinitas potencialidades que o País oferece à implementação de condições de vida mais digna, deixa evidenciado que nossas lideranças vêm acumulando falhas gritantes, não é de hoje, na missão de gerir os negócios da Nação. A ausência de um projeto nacional de desenvolvimento, capaz de galvanizar os esforços e capacidade criativa de nossas forças produtivas, explica o desalento e frustração que povoam lares e ruas. Ter que conviver com toda essa problemática, contemplando o tremendo desperdício das chances em solucioná-la, provocado pela insensibilidade das elites políticas, são circunstâncias que atestam ser mesmo o brasileiro, antes de tudo, um forte.

Exagero comemorativo. Vitorioso, com ampla maioria, na acirrada disputa pela presidência da Câmara dos Deputados, Arthur Lira tinha razões para sentir-se jubiloso. Mas, “pera lá”, não precisava levar “tão longe” a euforia. A celebração violou regras sanitárias estabelecidas, em nome de respeitáveis interesses pelos Poderes que representa. A opinião pública confessou-se estarrecida diante das desconcertantes cenas comemorativas. Festa dançante em grande estilo, música ao vivo, centenas de convidados despojados de máscaras protetivas, aglomerações indesejáveis nos espaços de luxuosa mansão, tudo isso regado por “comes e bebes” refinados. Onde já se viu! Se algum comensal, durante a “festa de arromba”, tivesse se dado ao trabalho de ligar a televisão iria se deparar, infalivelmente, com as recomendações da saúde pública pedindo a todos evitarem concentrações, utilizar máscaras, guardar distanciamento, práticas preventivas indispensáveis (acintosamente desprezadas no episódio) no combate ao flagelo que, no Brasil, já alvejou quase 9 milhões, ceifando 250 mil vidas.

O deputado Arthur Lira carece ser informado de que a autoridade moral inerente à missão institucional de que se acha investido é indissoluvelmente ligada a exemplos comportamentais. No caso específico da desajuizada celebração – de custo, por sinal, elevado – esse vínculo mostrou-se bastante desgastado.

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