Quando entrar setembro

Em novembro de 2008, a capa da Forbes trazia seu próprio editor-chefe com a manchete: “How Capitalism Will Save Us” (Como o capitalismo nos salvará?). A crise econômica mundial causada pelo estouro da bolha imobiliária dos EUA – por fraudes nas esferas financeira e comercial de Wall Street (dimensão econômica) – começava a implodir mercados.
A falta de ética (dimensão espiritual) passou a comprometer economias mundo afora. Bancos tradicionais, como o Lehman Brothers, faliram. Necessidades de redução abruptas de custos e reorientação de estratégias resultaram em galopante desemprego mundial (social), trazido pelo efeito dominó sobre as economias e demissões em massa.
Projetos públicos que contavam com a pujança da arrecadação privada foram desacelerados (dimensões política, social e ambiental), com a descontinuidade de investimentos e a desmobilização de mão de obra, face à queda fenomenal dos mercados.
Aquela pergunta na capa de um bastião do neoliberalismo era tão pitoresca quanto à jamais cumprida promessa de eficiência social do sistema. Como ele poderia salvar alguém? Além de nunca ter tido vocação para herói o capitalismo sempre foi insensível e excludente por natureza. E o humanismo não caracteriza sua alma, que ignora as consequências da ganância, desaguadas nas várias formas de desequilíbrio econômico e desigualdades no planeta (dimensão Social), sendo a fome uma das piores. E a célebre afirmativa de que “no capitalismo tem-se liberdade sem igualdade, enquanto no socialismo há o oposto”, não se sustenta para nenhum dos dois sistemas.
A “igualdade” no socialismo é relativa, pois as elites sempre nadaram em vantagens, sendo ignoradas a meritocracia e a liberdade. E no capitalismo, a “liberdade” é seletiva, pois o pobre sequer consegue circular fora dos núcleos periféricos sem bater nos limites da geografia da exclusão. E a igualdade, um sonho muito distante.
Êxodos mundiais, genocídio e miséria crônica, com um ‘pavimento humano’ revestindo as calçadas de capitais ricas, coroam os subprodutos do sistema. Inexiste a chance de compaixão (dimensão espiritual).
Talvez coubesse à Forbes a pergunta: “Por que os operadores do capitalismo e da política não levam a sério os ideais do desenvolvimento sustentável? Quem sabe a salvação acontecesse para mais pessoas?”. Isso, sem exaltar o mito de que o desenvolvimento acontece somente se produzido pelo mercado ou induzido pelo Estado; como se a sociedade civil não existisse, e toda a realidade social se circunscrevesse à interação entre os dois primeiros.
As pessoas fazem ou deixam de fazer coisas por razões de sociedade e não apenas em obediência às normas do Estado, seus incentivos ou guiadas pela lógica de mercado. Elas produzem riqueza livremente, com a satisfação de cooperar, sem buscar, obrigatoriamente, vantagens pessoais, que não a subsistência – muitas vezes coletiva. Elas se comprazem com suas cooperativas (dimensões social, econômica, cultural e política) – via o associativismo – porque há um fator “alma” a ser considerado, com sentimentos inclusive fraternais em jogo (dimensão espiritual). A sociedade civil (dimensão social) tem um papel insubstituível face à capacidade inesgotável de sentir, criar, produzir e inovar (dimensão econômica) com sensibilidade social.
As economias criativa e solidária estão aí para provar que a renda pode vir das tradições e dos saberes do povo (dimensão cultural) por um verdadeiro “industrianato popular”. Além da habilidade de se articular para amplificar recursos e reivindicar direitos (dimensão política). Modernas tecnologias e metodologias (dimensão econômica) potencializam tudo isso, em um tempo em que o empoderamento individual candidata-se ao posto de paradigma.
Quando entrar setembro, que uma nova visão de sustentabilidade seja a boa nova a inspirar candidatos ao governo, empresas e sociedade quanto à priorização do que realmente pode fazer a diferença no que se pretenda sustentável: o ser humano e escolhas conscientes!
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