Saque do FGTS: incentivo à economia ou aumento no déficit habitacional?

Aldemir Pereira Nogueira *
O governo federal anunciou que, até 26 de julho, irá editar uma medida provisória que trata de uma nova possibilidade do saque das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do Programa de Integração Social (PIS)/Patrimônio do Servidor Público (Pasep).
Embora o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, tenha dito que ainda estão sendo discutidos os detalhes técnicos dessa novidade, sabe-se que entre as possíveis alterações, está a extinção do saque automático do FGTS nas demissões sem justa causa. O que permitirá, por exemplo, a retirada dos recursos, uma vez ao ano, nas datas de aniversário dos cotistas. Quanto ao valor a ser liberado, o governo pretende estabelecer um teto de R$ 3 mil nas contas ativas do FGTS, bem como fixar um percentual de 15% sobre o saldo da conta vinculada, sob a justificativa de evitar o recebimento por aqueles que não precisam.
O governo defende que a disponibilização do FGTS irá estimular o consumo das famílias, injetando aproximadamente 30 bilhões de reais na economia. E o setor de construção civil discorda, visto que o FGTS é tido, para esse segmento, como a principal fonte de recursos para financiar a habitação das famílias de baixa renda.
O presidente da Associação Brasileira de Incorporações Imobiliárias (Abrainc), Luiz França, sustenta que “a liberação das contas ativas do FGTS não compromete apenas o setor da incorporação, mas também a recuperação econômica do País, dada a relevância da construção no PIB”. Luiz aponta que, quando o governo de Michel Temer autorizou, por exemplo, saques das contas inativas, parte dos recursos foi investida no mercado financeiro e não com consumo.
Porém, o economista-chefe do Banco ABC, Luis Otávio Leal, ressalta que essa medida adotada no governo Temer impulsionou o consumo das famílias e contribuiu para o crescimento de 1% do PIB brasileiro. Na época, foram injetados 44 bilhões de reais na economia.
Sobre o setor de construção civil, o ministro Onyx garantiu que o financiamento da casa própria no Brasil, do programa “Minha Casa, Minha Vida”, será mantido.
Caso seja editada da forma como foi anunciada, a referida medida provisória poderá proporcionar significativas alterações na Lei 8.036/90, que dispõe sobre o FGTS. E também na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pois atualmente o empregado pode levantar os valores depositados a título de FGTS, além da multa de 40%, em casos de dispensa sem justa causa, pelo empregador.
A legislação trabalhista atual também permite o levantamento de até 80% da conta vinculada do trabalhador, caso a rescisão do contrato de trabalho ocorra por acordo entre empregado e empregador.
Assim, se editada e aprovada nos termos anunciados, o governo federal poderá alterar o recebimento das movimentações do FGTS, modificando, em especial, os valores recebidos em decorrência da rescisão contratual de trabalho, seja por despedida sem justa causa pelo empregador ou por acordo entre os dois lados.
Uma vez liberados os respectivos valores, é provável que o PIB cresça e que novos empregos sejam gerados, conforme já destacado por especialistas. Contudo, o governo federal deve ter cautela para que a medida não aumente o déficit habitacional, já que o FGTS é a principal fonte de recurso para financiar imóveis às famílias de baixa renda. E isso seria prejudicial aos empregados, que, embora obtenham a benesse de 15% sobre o saldo da conta vinculada, nas datas de aniversário, poderão deixar de receber nas hipóteses de rescisão de contrato de trabalho.
Além disso, ainda que o governo garanta que o financiamento da casa própria no Brasil, referente ao programa “Minha Casa, Minha Vida”, seja mantido, o mercado imobiliário inevitavelmente sofrerá impactos negativos, à medida que a Lei 8.036/90 define as situações específicas de movimentação da conta vinculada do FGTS, a qual poderá ser significativamente alterada por meio da referida MP. Assim, com a flexibilidade da conta, o empregado terá maior liberdade na movimentação, deixando de utilizar esses valores em financiamentos habitacionais.
*Coordenador das áreas Cível e de Relações do Trabalho e Consumo do escritório Andrade Silva Advogados
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