Opinião

Uma revolução silenciosa

Uma revolução silenciosa
Crédito: DIvulgação

Uma experiência recente em meu retorno da Europa lançou luz a um problema sério. O apagão de mão de obra em alguns setores, o aéreo é um deles. Vejam meu cenário: um cancelamento de voo adiado para o dia seguinte, depois uma chegada ao aeroporto sem exibição nas placas informativas. Felizmente as informações recebidas por e-mail e no aplicativo da empresa informado de sua existência. Questionando, o pessoal muito ocupado e no meio de uma atmosfera um tanto caótica no aeroporto, consegui encontrar o balcão para o check in: ufa!

Depois, segui o processo de embarque sem muitos problemas, num voo regularmente decente, exceto pela comida que foi mais leve do que o normal para uma viagem dez horas. Soube que os trajetos noturnos são assim. Ok, sem problemas. Sobrevivi. Então, ao chegar em São Paulo, descobri no balcão da empresa parceira da que havia operado o primeiro voo, que minha conexão anunciada no aplicativo não havia sido reservada.

Uma maratona de estômago vazio entre os diferentes salões e balcões com minha mala me permitiu resolver o problema e garantir meu retorno a Belo Horizonte. Acreditem, esta viagem me tomou mais de 24 horas. Felizmente, com uma dose de paciência e bom humor, pude rir disso. Porém, também me peguei refletindo.

Podemos nos perguntar por que perdemos tanto em logística neste tipo de viagem. Minha experiência não é única. Ao contrário. É cada vez mais comum situação que demonstra a perda de confiabilidade no setor. Na nova temporada de uma variante Omicron, sabemos que a regularidade do atendimento do pessoal é menos confiável, sabemos que o pessoal temporário é mais difícil de recrutar e que a adaptação a uma nova organização que chamamos de pós-covisão (mesmo que ainda estejamos em ondas de contaminação) é difícil no mundo aéreo, mas também no hospital, na alimentação, na educação e em muitos outros setores. Mas por quê?

Esses setores enfrentam atualmente grandes dificuldades para recrutar os perfis necessários. Durante os dois anos da pandemia e, portanto, da adaptação a uma queda na atividade, muitos de seus funcionários perderam seus empregos com contratos temporários ou permanentes. No setor hospitalar, se esgotaram e deixaram seus postos.  Essas mesmas pessoas tiveram que  – ou foram capazes de –  se reorientar para outras atividades ou de treinar para outros projetos. Ao mesmo tempo, em momentos em que o capital de saúde é da maior importância, a reflexão sobre o significado da própria vida e como orientá-la parecia essencial.

A questão da qualidade de vida é mais importante do que nunca e está se tornando um critério mais importante do que no passado para a escolha de uma atividade profissional. Vários estudos mostram que os funcionários estão mais em busca de sentido, do significado de suas vidas e do significado das missões das organizações. A flexibilidade dada ao trabalho presencial ou a distância é considerada necessária, ao mesmo tempo em que se observa as oportunidades dadas à qualidade e às relações sociais e de trabalho ampliadas. Será que o mercado entendeu isso? As empresas devem se tornar uma fonte de aprendizagem e bem-estar. Portanto, deve haver uma ligação cada vez mais importante com o mundo da educação, a fim de proporcionar um treinamento contínuo conceitual e prático.

Estamos, portanto, diante de uma revolução silenciosa devido às novas motivações das pessoas que saem de anos traumáticos devido à Covid. Este trauma ou despertar está dando origem a novas aspirações em que as pessoas não querem mais trabalhar para viver da mesma forma que seus pais. Sua ambição é, na maioria das vezes, tornar-se um contribuinte para salvar o planeta diante das mudanças climáticas e não perder o sentido de suas vidas.

Vários estudos aprofundados têm sido realizados na Europa sobre a percepção do mundo dos negócios por jovens formados. Umestudo da SKEMA PUBLIKA, instituto de pesquisa da Faculdade SKEMA Business School, revelou uma falta de confiança no mundo corporativo entre os jovens da França, Estados Unidos, Brasil, China e África do Sul. Esta pesquisa corrobora com outros estudos que mostram os jovens em busca de sentido, e missões a eles confiadas e se preocupando bastante com o respeito ao meio ambiente.  Hoje em dia, a nova geração de profissionais não coloca mais o salário entre os primeiros critérios para selecionar uma oferta de trabalho. Alguns chegam ao ponto de deixar de buscar um contrato permanente e tomar iniciativas empresariais para permanecerem fiéis a seu projeto e valores.

Lamentar não resolverá o problema social nem empresarial. Estas observações convidam o mundo rever a qualidade da recepção em uma empresa e, sobretudo, a rever os métodos de trabalho para construir uma organização mais eficiente e inovadora. As oportunidades de desenvolvimento e aprendizado devem ser centrais, assim como a integração do significado das missões de acordo com os valores da empresa.

Naturalmente, a manutenção da viabilidade do modelo empresarial continua sendo central. Contudo, é mais assertivo concebê-la levando em conta o posicionamento dos funcionários e das partes interessadas ao projeto da empresa. Só assim ele será consolidado. Acredito que setores mais estressantes, mal remunerados ou menos reconhecidos se livram de apagões provocados por uma debandada de profissionais desinteressados ou insatisfeitos com uma perspectiva de gestão consciente.

Nesse sentido, é necessário reinventar-se de dentro para falar melhor com o mercado e garantir que a missão de cada um seja, sem dúvida, mais necessária do que no passado! Afinal, é você, empresário, que tem nas mãos a missão de conversar com o mercado e as partes interessadas para se manter no rumo certo. E seus os funcionários fazem parte disso!

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