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Do ferro ao lítio: o desafio de agregar valor na mineração

Setor enfrenta pressão por transparência e reformas após novos escândalos e antigos desastres
Do ferro ao lítio: o desafio de agregar valor na mineração
Foto: Reprodução Adobe Stock

Berço da mineração no País, Minas Gerais atravessou centenas de anos convivendo com uma atividade puramente extrativista e de curto prazo. Mas os tempos mudaram, o que a sociedade espera hoje do setor é uma atuação mais completa, responsável e com uma visão de futuro que englobe todos os stakeholders: de acionistas a comunidades atingidas, passando por fornecedores, clientes, colaboradores, agentes públicos, sociedade e especialistas.

Essa não é a mineração do futuro. É a mineração do presente. Ou, pelo menos, deveria ser. É o que cobra a sociedade, mas ainda não é o que se vê na prática na maior parte da atividade. Prova disso foi o recente esquema de corrupção envolvendo empresários e servidores de órgãos ambientais em prol da mineração em áreas protegidas de Minas Gerais, como a Serra do Curral, em Belo Horizonte, e a Serra de Botafogo, em Ouro Preto, na região Central do Estado, denunciados pela Polícia Federal (PF).

Uma afronta ao que o próprio setor se propõe: ser mais transparente e engajado com causas ambientais e sociais. A rede criminosa, especializada em mineração ilegal, corrupção e lavagem de dinheiro, foi desarticulada durante a Operação Rejeito, deflagrada pela PF, juntamente com o Ministério Público Federal (MPF) e a Controladoria-Geral da União (CGU).

O escândalo se soma a outros dois tristes episódios que marcam a história da mineração no Estado: os rompimentos das barragens da Samarco e da Vale, ocorridos em 2015, em Bento Rodrigues, na região Central, e em 2019, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

“São apenas três servidores para monitorar cerca de 40 mil processos na Agência Nacional de Mineração (ANM). Enquanto isso não mudar, vamos continuar acompanhando esse tipo de situação e não vamos ter uma mineração de qualidade. Tivemos duas tragédias e agora esse escândalo de corrupção. O que mais precisa acontecer para podermos modernizar a legislação? O empreendedor sério defende a reestruturação do setor e dos órgãos ligados à atividade. Aliás, quem não gosta da mineração nem pode morar em Minas Gerais”, defendeu o presidente da Comissão de Minas e Energia (CME) da Câmara, Diego Andrade (PSD). O deputado federal por Minas participou da primeira edição do projeto Itatiaia Eloos, do qual o Diário do Comércio é parceiro.

O futuro da mineração foi tema do primeiro encontro Itatiaia Eloos

O encontro reuniu autoridades, executivos e especialistas para debater entraves, avanços e caminhos para o futuro da mineração no Brasil. A necessidade do fortalecimento dos órgãos de fiscalização, da agregação de valor da atividade, do emprego de novas tecnologias e as oportunidades por meio dos minerais estratégicos e terras-raras foram as principais temáticas abordadas durante o evento.

“Precisamos de segurança jurídica, de fiscalização tecnológica e de uma contrapartida mais justa”, frisou o parlamentar, que lembrou de uma primeira tentativa de votar o Marco da Mineração por parte da bancada federal mineira ainda no governo Temer. O deputado afirmou que é preciso estruturar efetivamente a agência reguladora e pediu ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, presente no evento, que estabeleça como prioridade a contratação de 200 fiscais.

Diego Andrade
Andrade: precisamos de segurança jurídica | Foto: Reprodução YouTube Itatiaia

Além disso, Andrade frisou que pretende pautar na CME o projeto do deputado Júlio Lopes (PP-RJ), que cria o Operador Nacional do Sistema Mineral. Ele explicou que o órgão não precisa de uma estrutura grande e que bastaria um convênio com uma secretaria estadual para identificar e acompanhar a gestão das mineradoras.

Leia Mais: Setor mineral terá Conselho Nacional de Política com foco em terras-raras

Semad já testa uso de Inteligência Artificial nos processos de licenciamento

A secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Marília Melo, por sua vez, destacou que critérios técnicos objetivos são essenciais e adiantou que a Semad está começando a aplicar Inteligência Artificial nas análises. Segundo ela, a falta de objetividade da legislação brasileira é um dos grandes desafios nos processos de licenciamento.

Marília Melo
Marília Melo: celeridade é essencial | Foto: Reprodução YouTube Itatiaia

“Infelizmente, a legislação brasileira traz uma abertura para interpretações múltiplas e, muitas vezes, as discussões chegam ao Judiciário. Meu sonho era que o licenciamento fosse binário: sim, sim; não, não. Os advogados me falam que isso não é viável, mas vamos chegar o mais próximo possível disso. Precisamos ter regras claras e transparentes”, defendeu.

Marília Melo também detalhou os avanços da fiscalização em Minas Gerais. Conforme a secretária, desde 2024, todos os licenciamentos que entram no Estado são analisados dentro do prazo legal. “É importante que a gente tenha celeridade no sim ou no não. Assumimos a secretaria com um passivo de aproximadamente 3 mil processos pendentes. Hoje são 290, e a previsão é zerar esse número até o ano que vem”, afirmou.

Já o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, defendeu o aprimoramento da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no início do mês, com 63 vetos, para destravar gargalos. Segundo o dirigente, os vetos de Lula descaracterizam a lei.

Roscoe argumentou que o licenciamento não afeta a proteção ambiental. “Muitas pessoas, mal compreendidas, dizem que precariza a segurança ambiental. Precarização ambiental é não licenciar. […] Fazer o certo no Brasil é muito difícil. Toda vez que você fragiliza um instrumento, abre margem para distorções. Nosso objetivo é que o setor mineral possa contribuir com a sociedade da maneira mais clara e rápida possível. Lembrando que, se o licenciamento for rápido, a inflação cai, porque vai ter mais oferta. Toda vez que o licenciamento é moroso, inibe-se a oferta”, defendeu.

Principais insights

Valor agregado: Mineração em Minas não deve se limitar à exportação de minério bruto; é preciso estimular a cadeia produtiva completa, do ferro ao aço e aos produtos finais.
Lítio como oportunidade: Minas deve transformar o potencial de exploração em cadeia industrial de baterias.
Terras-raras: Potencial de ser um game changer para o Brasil, desde que haja internacionalização e atenção dos empresários.
Diversificação econômica: Mineradoras precisam preparar as comunidades para o futuro, com ou sem a mineração.
Tecnologia e IA: Já transformam toda a cadeia, da extração à logística, passando pela segurança e pela transição energética.
Potencial do País: Geografia, energia renovável e posição estratégica podem colocar o Brasil como líder em minerais críticos e na atração de investimentos.

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