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Minas Gerais aposta em planejamento para transformar municípios em cidades inteligentes

Nova lei estadual mira o futuro com inclusão territorial e inovação
Minas Gerais aposta em planejamento para transformar municípios em cidades inteligentes
Foto: Reprodução Adobe Stock

Minas Gerais está em processo de consolidação de um novo paradigma de desenvolvimento, com foco na sustentabilidade, inovação e planejamento estratégico de longo prazo. Aprovada em julho de 2024, a Lei 24.839, que institui a Política Estadual de Incentivo às Cidades Inteligentes, entrou em nova fase: a de sair do papel e virar realidade por meio de programas, projetos e orçamentos vinculados.

“A lei por si só não executa projetos. Ela estabelece diretrizes. Agora o governo estadual precisa vincular programas já existentes à política e criar novas ações, com orçamento específico, para que a transformação ocorra de fato”, explica a coordenadora do Grupo de Trabalho de Cidades Inteligentes na Assembleia Legislativa de Minas (ALMG) e fundadora do Instituto Lice, Graziele Carvalho.

Segundo a especialista, o processo de estruturação interna já começou. Para isso, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico (Sede), lançou editais de chamamento para startups com soluções voltadas à governança digital municipal e à capacitação de servidores. “Já foram selecionadas empresas para fornecer ferramentas tecnológicas aos municípios, com testes-piloto e cursos em fase de edição. Ainda não chegou à ponta, mas os alicerces estão sendo construídos”, resume.

De fato, procurado, o governo disse que, em linhas práticas, já operacionaliza ações que possuem sinergia com a Política enquanto estratégia de articulação intermunicipal. E cita o programa Cidades do Futuro, que está em atividade desde 2024 e integra ações de planejamento municipal, transformação digital, modernização da gestão por meio de testes gratuitos de soluções tecnológicas e promoção do desenvolvimento sustentável nos municípios.

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“O programa já conta com 100 municípios aderidos e em atividade, além de mais de 50 soluções de cidades inteligentes disponíveis para contribuir para o desenvolvimento das governanças, conectividade, serviços públicos digitais, entre outras. A atuação do programa perpassa, inclusive, por metas claras do Programa Minas Inteligentes, como, por exemplo, estimulo à colaboração entre sociedade civil, setor privado e municípios e fomento à eficiência em serviços urbanos. Com o avanço do Programa Cidades do Futuro – e tendo em vista a Política Estadual de Cidades Inteligentes e do programa Minas Inteligente – o objetivo é garantir a maturidade, perenidade e continuidade das ações municipais desenvolvidas no programa governamental, sempre atentando para os princípios sobre ética pública, inovação, inclusão e resiliência”, disse a Pasta em nota.

Ainda conforme o Executivo, uma das principais iniciativas em curso diz respeito ao programa Moradas Gerais, desenvolvido pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), que contempla as modalidades Urbana e Rural e tem como foco a promoção de moradias mais dignas e sustentáveis, com o uso de tecnologia e assistência técnica.

Na modalidade Urbana, o projeto-piloto foi iniciado em junho no Novo Lajedo, em Belo Horizonte, e contempla até mil habitações com intervenções como reparo de telhados, troca de piso, pintura e impermeabilização, com investimento de até R$ 35 mil por residência e aporte total de R$ 43 milhões. 

Já na modalidade Rural, a ação se divide em duas frentes: a primeira, sob responsabilidade da Subsecretaria de Política de Habitação, prevê a construção de módulos sanitários em áreas rurais, com meta de entrega de 3.000 unidades até 2027; a segunda envolve o desenvolvimento de projetos e repasse de recursos a municípios para reformas em moradias vulneráveis, com acompanhamento técnico da Sedese.

“Essa abordagem alia soluções tecnológicas a intervenções de impacto imediato, promovendo qualidade de vida e inclusão social. A Sedese também desempenha papel estratégico no fortalecimento da capacidade técnica dos municípios, promovendo encontros regionais, que oferecem capacitações sobre habitação de interesse social, planejamento urbano e execução de projetos. Além disso, a Secretaria disponibiliza atendimento técnico individualizado para as prefeituras, mediante agendamento, de acordo com demandas específicas de cada município”, explica o governo.

Já a lei consolida seis eixos estratégicos que estruturam o planejamento estadual. São eles:

  • governança
  • planejamento territorial
  • desenvolvimento econômico
  • inovação
  • capacitação de pessoas e 
  • parcerias.

“Política pública não é algo de resultado imediato. Exige governança, conciliação de interesses e clareza de prioridades. E a lei por si só não executa projetos. Ela estabelece diretrizes. Agora o governo estadual precisa vincular programas já existentes à política e criar novas ações, com orçamento específico, para que a transformação ocorra de fato”, explica Graziele Carvalho.

Referência nacional quando o assunto é ‘cidades inteligentes’

Conforme Graziele Carvalho, Dos 27 estados brasileiros, apenas Minas e Goiás possuem leis estaduais voltadas às cidades inteligentes. A mineira, no entanto, é mais ampla. “Nossa lei não se limita à digitalização ou tecnologia. Ela se ancora em compromissos internacionais como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU e a Nova Agenda Urbana. Isso permite captar recursos nacionais e internacionais com mais facilidade”, diz.

A especialista explica que um dos diferenciais da nova legislação mineira é a abordagem territorial completa. Enquanto outras experiências brasileiras se concentram em áreas urbanas, como é o caso da proposta nacional em tramitação no Congresso, a política mineira incorpora também o espaço rural à lógica das cidades inteligentes.

“Minas tem a inteligência de entender que mais de 90% dos seus municípios possuem menos de 50 mil habitantes e estão, majoritariamente, em territórios rurais. O conceito de cidade inteligente que propusemos abrange tanto o urbano quanto o rural, caracterizados por uma inteligência coletiva que sustenta a vida nas cidades”, diz.

Desafio está na transformação cultural

Em Minas, dois programas – Cidades do Futuro e Minas Livre para Crescer – são os principais canais para operacionalizar a política. O primeiro já conta com mais de 80 municípios aderentes, e o segundo, com mais de 500. A adesão, no entanto, é voluntária. “É um movimento de formiguinha. Precisamos entrar em cada cidade, sensibilizar cada gestor e mostrar que essa é uma oportunidade de desenvolvimento”, diz Graziele Carvalho, que atua diretamente com os municípios no apoio à adesão e implementação.

Graziele reitera que o sucesso do programa passa, antes de tudo, por uma transformação cultural na administração pública. E que o momento é propício. O governo federal, sob coordenação da ministra Simone Tebet, iniciou o projeto “Planejamento Brasil 2050” com o objetivo de articular uma visão de futuro para o país. “Esse movimento nacional ajuda a fortalecer a cultura do planejamento também nos municípios. Afinal, ninguém investe em um lugar que não sabe para onde quer ir. Isso vale para o Brasil e vale para cada cidade”.

Mas ainda existem desafios. Especificamente, a falta de cultura de planejamento ainda aparece como um entrave importante para o avanço da política pública no País. Por isso, Graziele Carvalho afirma que o grande gargalo não é a escassez de recursos, mas a ausência de conhecimento técnico.

“O Brasil não tem problema de dinheiro, tem problema de conhecimento. Os municípios não sabem onde está o recurso, como acessá-lo, como escrever um projeto ou mensurar seu impacto. Existe um caminho básico que poucos compreendem: primeiro vem o plano (a lei), depois o projeto (ações vinculadas) e por fim, o orçamento. Sem isso, nada sai do papel. E mesmo servidores antigos desconhecem esse fluxo”, lamenta.

Ela também alerta que a descontinuidade administrativa também agrava o cenário. “Muda a gestão, mudam as prioridades. Muitas vezes, projetos valiosos vão para a gaveta apenas por serem de governos anteriores. É um desperdício de tempo e dinheiro público”, critica. Para a especialista, esse ciclo só será rompido com a institucionalização de metas de longo prazo e a formação de quadros técnicos qualificados – pilares previstos na própria legislação estadual.

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