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Lítio, hidrogênio verde e energia solar colocam Minas Gerais como protagonista da matriz nacional

Com projetos voltados à sustentabilidade e à indústria limpa, Estado atrai investimentos bilionários em tecnologias limpas, impulsiona a diversificação produtiva e fortalece o desenvolvimento regional
Lítio, hidrogênio verde e energia solar colocam Minas Gerais como protagonista da matriz nacional
Foto: Reprodução Adobe Stock

Se o Brasil tem potencial para se transformar em celeiro do mundo quando o assunto é segurança alimentar, na área de transformação energética vem se despontando cada vez mais como um canhão, jogando luz sobre as diferentes frentes de atuação que permitirão uma produção mais sustentável e duradoura, em uma relação mais justa e amigável com o planeta.

Há muito, os combustíveis fósseis e a geração tradicional já não são as únicas formas de gerar energia, tampouco se mostram competitivos e rentáveis diante das transformações que se impõem na sociedade moderna. Inicialmente, os modelos hidrelétricos, eólicos e solares, ao lado de opções como o gás natural e o carvão vegetal, surgiram para quebrar paradigmas e indicar alternativas em um caminho tão eficiente ou mais que o tradicional. É uma transformação que não cessa e vê surgir, a cada dia, novos atores que já fazem ou farão parte dessa transição: hidrogênio verde, minerais críticos, terras raras e muitos outros elementos que ainda nem conhecemos.

Minas Gerais se destaca nesse cenário: berço da mineração, com metais milenares como o ouro e o minério de ferro, o Estado não para de dar sua contribuição na era das novas fronteiras minerais e tem apresentado ao mundo suas importantes reservas de nióbio, lítio, grafita e terras-raras. Alguns desses recursos ainda são incipientes, mas todos apresentam potencial de agregação de valor e de atração de indústrias de ponta para a transformação dos minérios em produtos acabados, como no caso das baterias.

O lítio está concentrado no Vale do Jequitinhonha, onde o governo mineiro desenvolveu o chamado Vale do Lítio e tem atraído dezenas de bilhões em investimentos para a região, em projetos com gigantes internacionais. Já as terras-raras contam com a única reserva oficialmente reconhecida do Brasil, em Araxá, no Alto Paranaíba, além de outros depósitos no Sul do Estado.

No caso do hidrogênio verde, Uberaba, no Triângulo, se prepara para receber uma planta industrial que promete transformar a cidade em um polo de desenvolvimento de negócios sustentáveis. Com investimentos de R$ 7,8 bilhões, o empreendimento será instalado na Zona de Processamento de Exportação (ZPE), em um projeto da empresa portuguesa H2Green, por meio da subsidiária H2Brasil, e vai produzir, além do hidrogênio, amônia verde.

Na geração de energia, enquanto o País é destaque mundial por já deter 88% de sua matriz limpa – majoritariamente proveniente da geração hidrelétrica -, Minas desponta na solar. Já são 12,8 gigawatts (GW) de capacidade instalada de energia elétrica produzida exclusivamente por fonte solar fotovoltaica. O recorde foi alcançado com a soma de 7,4 GW em Geração Centralizada (GC) e 5,4 GW em Geração Distribuída (GD), segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

O Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) espera concretizar ainda neste ano a captação de até US$ 200 milhões junto ao New Development Bank (NDB). A partir desses recursos, o banco mineiro disponibilizará linhas de financiamento em condições ainda mais vantajosas a prefeituras e empresas de todos os portes para realização de projetos conectados com a sustentabilidade em áreas como mobilidade urbana, energia renovável e limpa, eficiência energética, descarbonização, agricultura sustentável, saúde, entre outros, impulsionado os negócios no estado. A captação com o NDB é a primeira do BDMG com o aval da União, o que permitirá oferecer financiamentos com taxas ainda mais reduzidas e, principalmente, dar prazos mais longos para as operações. “Quando conseguimos condições diferenciadas de captação de recursos, conseguimos reverter isso em benefícios ao cidadão mineiro. São taxas mais vantajosas que servirão de estímulo para impulsionar negócios e empresas em Minas Gerais, em linha com o que o Governo do Estado tem realizado, sempre focado em promover o desenvolvimento regional”, explica o presidente do BDMG, Gabriel Viégas Neto. Captações recordes A parceria com o NDB vai ampliar os resultados recordes alcançados pelo banco. Depois de atingir marca histórica em captações de recursos no mercado interno e externo em 2024, neste primeiro semestre de 2025 o banco já soma R$ 1,45 bilhão em captações, crescimento de 30% em relação ao mesmo intervalo do ano anterior e volume nunca alcançado para este período. Histórico A negociação começou em outubro de 2022, quando a Comissão de Financiamento Externo (Cofiex) aprovou a captação. Já em setembro de 2023, a Assembleia Legislativa de Minas deu aval em segundo turno para a operação, etapa necessária em função da contragarantia prestada pelo Estado. Outras etapas da contratação incluem aprovações da Secretaria do Tesouro Nacional, da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, do Ministério da Fazenda, da Casa Civil e, por fim, publicação de resolução de autorização da contratação pelo Senado Federal para posterior assinatura do contrato entre BDMG e NDB.
Foto: Gil Leonardi / Imprensa MG

Com isso, a potência instalada das usinas de energia solar fotovoltaica na geração centralizada em Minas Gerais corresponde a 39,2% da capacidade de GC de energia solar em todo o País. Já em relação à geração distribuída, a potência instalada das unidades mineiras de energia solar é responsável por 12,6% da capacidade total nessa modalidade no Brasil.

E o País, ao todo, reúne 61,9 GW de potência instalada para a geração de energia solar fotovoltaica – somando as modalidades centralizada e distribuída. Os 12,8 GW de Minas Gerais correspondem, portanto, a 20,7% de toda a capacidade nacional de produção de eletricidade por meio dessa fonte renovável proveniente da radiação solar.

Brasil tem vantagem em energia limpa, mas regulação ainda é obstáculo

Para o líder de Energia e Recursos Naturais da EY, Afonso Sartorio, o Brasil tem uma grande vantagem em relação ao restante do mundo quando o assunto é transição energética. Isso porque conta com uma matriz predominantemente limpa e renovável, enquanto países importantes e fundamentais para a economia global ainda “precisam correr atrás” diante das metas de descarbonização de empresas e nações.

“Muitos terão de investir consideravelmente para nos alcançar. E, no patamar em que nos encontramos, já conseguimos suprir nossa demanda e ganhar competitividade no mercado externo. Mas, como nem tudo são flores, aspectos como legislação e regulação precisam evoluir. Não estamos na Idade da Pedra, mas o hidrogênio verde merece um Plano Nacional, e a distribuição de energia precisa de constantes investimentos, especialmente na infraestrutura de transmissão”, exemplifica.

Assim como na maior parte da indústria brasileira, também na transição energética um dos grandes desafios está na agregação de valor. Sartorio observa que, no caso dos metais raros – como o nióbio, extraído com exclusividade em solo mineiro -, a transformação local em baterias seria essencial para a competitividade do País.

“Se você transformar no País, em vez de apenas exportar, terá uma vantagem. E, fazendo isso com uma energia abundante, renovável e de baixo custo, será uma vantagem ainda maior. Mas isso também precisa ocorrer a custo competitivo, o que passa pela regulação”, frisa.

Gás Natural
Crédito: Divulgação

O especialista cita o caso do gás natural: “O gás natural brasileiro é caro e inviável. Por quê? Porque a cadeia produtiva não é eficiente do ponto de vista regulatório. Ele nem é renovável, mas é considerado limpo e amplamente utilizado no nosso parque industrial. Precisamos de investimentos em infraestrutura para viabilizar uma produção e distribuição acessíveis, que permitam o avanço dos projetos”, explica.

Cinco entraves mantêm o País atrás no setor elétrico, diz especialista

O consultor de energia Rafael Herzberg lista cinco pontos que fazem o Brasil perder competitividade quando o assunto é energia – embora o País tenha inúmeros atributos que o colocam em posição de destaque no cenário global. São eles:

  • “Gatos”
  • Subsídios
  • Obras inacabadas
  • Resposta à demanda
  • Ajuste dos horários de ponta e fora de ponta

Quanto aos “gatos”, ele avalia que o problema persiste porque é liderado pelo crime organizado. Já os subsídios, Herzberg os classifica como perversos, pois estimulam soluções que prejudicam todos os demais – “a exemplo do que ocorre com a energia solar”, diz.

Equipe de manutenção da Cemig.
Foto: Cemig / Divulgação

Sobre as obras inacabadas, o consultor cita Angra 3 como um caso emblemático, que há décadas consome bilhões de reais da população, sem o resultado esperado. Afirma ainda que a resposta à demanda deve ser oferecida amplamente e que o Brasil está atrasado nesse quesito – o que significa que o sistema vem sendo demandado de forma perigosa, chegando perto do limite de sua capacidade. Por fim, ele defende o ajuste dos horários de ponta e fora de ponta aos horários reais, alegando que a definição atual está ultrapassada e causa um descompasso entre a formulação das tarifas e o comportamento real da curva de demanda no País.

“Esses pontos caracterizam um País completamente descompassado e defasado na área de energia elétrica. Não à toa, ao se comparar com os demais países dos Brics, o Brasil hoje ocupa a última posição em custo de energia por quilowatt-hora (kWh). Mais uma vez, é o custo Brasil impactando nossa competitividade e representando bilhões de reais perdidos todos os anos”, lamenta.

Especificamente no caso da energia, Herzberg denuncia que as decisões e a regulação do setor não estão centradas na meritocracia de custos, mas em interesses de grupos específicos. Por isso, segundo ele, o Brasil não se torna uma referência mundial no segmento, mesmo com inúmeros diferenciais. “Falta visão, capacidade técnica e cobrança sistêmica do regulador, do Ministério de Minas e Energia, de todos. Não existe hoje uma união pela eficiência do País na área de energia”, alerta.

ONS CHUVAS HIDRELÉTRICAS
Crédito: Reuters/ Rickey Rogers

O consultor exemplifica com a priorização das fontes de energia no País, comparando as energias solar e hidrelétrica e destacando as emissões de carbono em relação ao volume de energia produzido.

“A hidrelétrica é a mais eficiente de todas e, aqui no Brasil, optou-se por inverter a ordem e privilegiar as fontes solar e eólica, que têm um conjunto de emissões mais alto por quilowatt-hora (kWh) produzido. A energia solar depende de itens importados e gera uma produção não firme, enquanto o País possui um grande potencial inexplorado de energia hidrelétrica, que é firme, gerada integralmente no Brasil e capaz de empregar amplamente trabalhadores brasileiros. Mas, por conta de interesses específicos, foi considerada, em relação à solar, menos vantajosa”, critica.

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