‘É preciso abrir mão do lucro imediato para pensar o futuro’, diz presidente da RHI Magnesita

A RHI Magnesita é líder global na indústria de refratários e desenvolveu um modelo de negócio que transforma a mineração em um processo de geração de valor. Com unidades em Minas Gerais e na Bahia, a empresa integra a extração mineral à produção e ao desenvolvimento de soluções inovadoras, estabelecendo relações de longo prazo com clientes e fornecedores.
Esse diferencial levou a matriz a optar pela consolidação das operações na unidade mineira, dando origem à divisão RHI Magnesita Latam – resultado da união das operações da regional América do Sul, das plantas do México e do atendimento comercial à América Central. A iniciativa marca o aprofundamento da estratégia de regionalização da empresa, iniciada há três anos.
Wagner Sampaio tornou-se, então, presidente da RHI Magnesita na América Latina e recebeu o Diário do Comércio para uma conversa sobre o futuro. Defensor de um desenvolvimento econômico atrelado à visão de longo prazo – especialmente no setor mineral -, o executivo detalhou como a companhia tem feito investimentos robustos e estratégicos, mesmo diante de incertezas macroeconômicas e políticas.
Para Sampaio, decisões responsáveis vão além do lucro imediato. É preciso considerar sustentabilidade, uma cadeia produtiva eficiente e o engajamento com stakeholders – incluindo governos, fornecedores, comunidades e clientes. Segundo ele, o instinto de sobrevivência e a insegurança quanto ao futuro ainda impedem muitas empresas de adotar esse tipo de postura, mas a RHI busca liderar pelo exemplo.
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Na conversa, o executivo destaca também os desafios da infraestrutura logística no Brasil e a importância das reformas estruturais para garantir competitividade e previsibilidade. Ele reforça que, mesmo com entraves, a empresa acredita no potencial do País – sobretudo de Estados como Minas Gerais e Bahia, com tradição mineral e vocação energética.
A entrevista aborda ainda a recém-criada divisão Latam da empresa, que une operações da América do Sul, México e América Central, consolidando a estratégia local for local. A ideia é fortalecer a cadeia produtiva regional e manter proximidade com os clientes, apostando em inovação, sustentabilidade e sinergia operacional.
Como a RHI Magnesita lida com o planejamento de longo prazo?
Quando fui convidado a assumir a presidência, perguntei aos donos da empresa em quanto tempo venderiam a empresa, porque precisamos pensar no futuro, não no imediatismo. No passado, o grupo de investidores que detinha a maioria das ações tinha uma visão mais imediatista, limitada ao lucro. Hoje, a RHI Magnesita pensa em oito, dez gerações à frente. É uma empresa que investe em pessoas, processos, descarbonização e meio ambiente. Muito séria, com uma visão de longo prazo. Foi isso que me conectou à empresa e que também conecta com o Parceiros do Futuro. Temos o mesmo propósito. Acabamos de investir em um forno em Brumado (BA), o que comprova isso. Custou mais de R$ 500 milhões, com o entendimento de que esse investimento é importante para o futuro, pois reduz emissões de carbono, prolonga a vida da mina – ou seja, uma mineração consciente – e ainda aumenta nossa capacidade de produção. E num País como o Brasil, isso mostra que a empresa acredita no Brasil e deseja que as economias se desenvolvam por si, sem depender de uma grande trading de mercadorias, o que não é bom para o meio ambiente, nem para ninguém.
O que você enxerga hoje como principal – ou um dos principais – entraves para essa apropriação por parte das empresas?
O primeiro é o instinto de sobrevivência, pois uma competição injusta pode levar ao imediatismo. É preciso sobreviver. Outro fator talvez seja a insegurança quanto ao futuro, que leva à tomada de decisões imediatistas – pensando apenas no lucro, como forma de proteção. E isso envolve todos os stakeholders e também os cenários macroeconômico e político, tanto internos quanto internacionais.
A empresa segue uma política de investimentos em curto, médio e longo prazos?
Hoje aprovamos investimentos com payback de cerca de três a cinco anos. Quando o retorno é inferior a três anos, logicamente, precisamos executar, porque não há perda de capital. Mas poderia ser de dez ou 15 anos. Países com visão de longo prazo aprovam investimentos pensando apenas em três anos? Precisamos de equilíbrio. A RHI tem projetos com retorno em três anos, mas também tem de dez, porque acredita no futuro – e acredita que isso será importante não só para o Brasil, mas para o mundo. O board sabe que o refratário será essencial para todas as economias e reconhece que o Brasil possui um minério de altíssima qualidade. Por isso, pensaram: por que não investir em um forno, mesmo sem retorno imediato?
Ao mesmo tempo, a questão da infraestrutura logística na região de Brumado é um ponto que preocupa…
Sim. Por isso, o entendimento dos nossos parceiros – e do próprio governo – de que a visão de futuro é mais importante que o imediatismo é fundamental para garantir que o que estamos fazendo não dará errado. Isso inclui ferrovia, portos eficientes para escoamento da produção e, inclusive, as reformas administrativa e tributária, essenciais para simplificar o País e a gestão das empresas. Tudo isso é de suma importância. E acreditamos que acontecerá – se não acreditássemos, não investiríamos. Agora, meu papel, enquanto presidente regional, também é influenciar. Ou seja, estou aqui para compreender e transmitir essa importância, e, às vezes, abrir mão do lucro. Claro, o lucro é importante, mas é preciso pensar no futuro, porque tudo muda – e, em algumas situações, perder hoje significa ganhar amanhã. Parar uma ferrovia, por exemplo – será que, num futuro próximo, outro recurso, outro mineral não poderá ser descoberto? Por isso, é preciso ter os pés no chão e os olhos voltados para o futuro. Neste projeto, especificamente, temos dialogado com nosso parceiro estratégico na área logística (VLI, no Corredor Minas–Bahia), com o governo e com as prefeituras e governos estaduais.
A Bahia hoje desponta como um dos principais investidores em novos minérios. Por isso o investimento lá?
Exatamente. Mas Brumado surgiu muito antes disso. Foi uma das primeiras operações de mineração. Realizamos essa modernização e expansão da capacidade já pensando nesse potencial de longo prazo do Brasil – mas, principalmente, de Minas e da Bahia. E isso pesa bastante, porque são Estados tradicionalmente mineradores, com estrutura e vocação. É diferente de investir em um país ou região sem infraestrutura. A Bahia está despontando, junto com Minas e outros Estados estratégicos, não só em recursos minerais, mas também em energia verde – que é igualmente essencial. Falamos muito sobre energia porque não se minera sem energia, não se fabrica sem energia.
Como você avalia o cenário internacional e o conflito comercial entre China e Estados Unidos?
Essas medidas tarifárias geram insegurança nos investidores. E um dos nossos principais mercados é o de metais: siderurgia, metal e aço. O presidente Donald Trump aumentou o Imposto de Importação sobre o aço e o alumínio provenientes do Brasil. Isso cria incerteza para nossos clientes que exportam para os Estados Unidos – e, consequentemente, para nós. Essa instabilidade repercute globalmente. O investidor recua, o que pode causar queda na demanda. Por isso, é fundamental unirmos forças para sermos fortes juntos. Mesmo com uma tarifa – não necessariamente de 50%, mas qualquer tarifa -, ela é uma barreira. Ainda assim, não significa que seja intransponível. É possível manter competitividade mesmo com barreiras. Precisamos nos preparar para sermos uma economia forte — um Brasil forte, uma Minas Gerais forte – e também apta a exportar, mesmo diante das tarifas. Se tivermos custos competitivos, uma boa pegada de ESG – cada vez mais valorizada pelos consumidores -, o mundo estará disposto a pagar mais por aquilo que é melhor e mais correto. Se tivermos uma manufatura e uma mineração responsáveis, de baixo custo e com toda a cadeia colaborando, ofereceremos segurança ao investidor.
A RHI Magnesita Latam acaba de ser criada, resultado da união das operações da regional América do Sul, das plantas do México e do atendimento comercial à América Central. De que maneira isso pode contribuir para esse pensamento de longo prazo?
É uma honra para nós receber a América Central. Esse movimento está alinhado à filosofia local for local, ou seja, de integração regional. O principal objetivo é otimizar a produção para atender com ainda mais eficiência à demanda dos mercados latino-americanos. Com isso, buscamos estreitar ainda mais o relacionamento com os clientes da região e consolidar uma cadeia mais sustentável e conectada à realidade local. Estamos construindo um modelo de gestão colaborativo, inovador e preparado para crescer com nossos times. E estamos replicando o modelo 4PRO, desenvolvido por nós, que orienta nossa interação com clientes que compartilham valores semelhantes – baseado em quatro pilares (4P): performance, parceria, pessoas e planeta. Como o Diário do Comércio já noticiou, não vendemos refratários: vendemos o produto feito sob demanda, conforme a necessidade do cliente.
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