Política

Brasil vai à ONU em meio a tensão diplomática com os EUA

Sanções, tarifas e busca por diálogo
Brasil vai à ONU em meio a tensão diplomática com os EUA
Foto: Ricardo Stuckert/PR

Em um cenário marcado por fortes tensões diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos (EUA), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursará na 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas nesta terça-feira (23), em Nova York. Este pode ser o primeiro grande palco em que Lula e Donald Trump se encontrarão frente a frente.

O pano de fundo da participação brasileira inclui sanções impostas por Washington a autoridades nacionais, tarifas punitivas adotadas por Trump, acusações de golpe de Estado e uma crise institucional com repercussões internacionais.

Com o tema “Melhor juntos: 80 anos e mais para paz, desenvolvimento e direitos humanos”, a 80ª sessão da Organização das Nações Unidas (ONU) ocorre em um momento de reconfiguração geopolítica global. Lula deve se reunir com o secretário-geral da ONU, António Guterres, além de chefes de Estado e governo de diversas nações.

Sanções e impasses diplomáticos

O governo dos EUA impôs sanções ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e à esposa dele, a advogada Viviane Barci de Moraes, com base na Lei Magnitsky – legislação que permite medidas punitivas contra indivíduos acusados de corrupção ou violações de direitos humanos. As acusações incluem prisão preventiva arbitrária e restrição à liberdade de expressão, além de atingirem familiares e o patrimônio pessoal do ministro.

Segundo o professor José Luiz Quadros de Magalhães, especialista em direito internacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é improvável que a Assembleia da ONU resulte em uma reversão imediata das sanções. “Embora Lula seja um negociador habilidoso, as sanções estão prejudicando mais o povo norte-americano do que o Brasil, mas não vejo uma saída rápida ou positiva no curto prazo”, avalia.

Magalhães classifica as medidas como “extremas” e fruto de um governo que, segundo ele, atravessa uma crise de legitimidade. “Vivemos a decadência de um império. Os EUA ainda são a maior economia e potência militar do mundo, mas enfrentam uma crise moral e de credibilidade institucional”, afirma.

Ele também aponta que a ascensão da China e o fortalecimento dos Brics representam uma ameaça direta à hegemonia econômica dos EUA, intensificando a tensão geopolítica.

Espaço para negociação, com limites

Para o professor de gestão, negócios e relações internacionais da Una Fernando Sette Júnior a participação de Lula na Assembleia Geral das Nações Unidas pode representar uma oportunidade estratégica, ainda que restrita.

“A reversão total das sanções em curto prazo é improvável, dado o cenário político norte-americano e a natureza das medidas. Mas há brechas diplomáticas que podem ser exploradas”, explica.

Uma das possibilidades, segundo Sette Júnior, é o recurso ao sistema multilateral: “Acionar a Organização Mundial do Comércio (OMC) pode ter mais efeito político do que prático, já que o mecanismo de solução de controvérsias está enfraquecido. No entanto, iniciar um contencioso pode sustentar a narrativa de que as tarifas violam normas do comércio internacional”, completa.

Para ele, a expectativa deve ser moderada. “Há espaço para avanços pontuais, não para a eliminação completa das barreiras”, pondera.

Diplomacia pragmática em cenário sensível

Apesar da tensão provocada pelas sanções pessoais a autoridades brasileiras, como as impostas a Moraes e sua família, o professor da Una ressalta que ainda há margem para negociação. “Essas medidas seguem a lógica do Global Magnitsky Act, que mira indivíduos, não estados. Isso mantém aberta a porta para ajustes comerciais e diplomáticos”, comenta.

Para Sette Júnior, na prática, o cenário é de “janela estreita”. “O Brasil pode buscar soluções técnicas, como isenções tarifárias em setores específicos, ou conter o avanço de novas sanções. Para isso, será necessário adotar uma postura diplomática pragmática, evitando confrontos públicos que possam fortalecer a retórica de firmeza por parte de Washington”, conclui.

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